domingo, 2 de abril de 2023

18.03.23

 

Por vicissitudes da vida de seus pais, os dois irmão nasceram em Lisboa e cresceram no concelho de Peniche. Seus pais eram oriundos das terras fronteiriças da Beira Baixa com os extremenhos espanhóis.

Dos trinta e sete primos e primas direitos de seu pai, só dois ou três não saíram em busca de uma vida melhor continuando na lavoura por Segura e Salvaterra do Extremo. De todos os primos só os seus pais voltaram logo que o pai atingiu o dia da aposentação, passando a viver na Zebreira.

No sótão da casa foram amontoando papeis, roupas e mobiliário cujos familiares herdeiros de tios e primos lhes pediam para guardar e por lá ficaram esquecidos.

Ao arrumar ou dar uma ordem ao que encontrou após a morte do pai, encontrou a relíquia do:

Número Único – Novembro de 1982 do “JORNAL DE SALVATERRA DO EXTREMO”, editado com o patrocínio de VIMÓVEIS, LDA., sendo director do mesmo o senhor Carlos Alberto Garcia Teodoro.

Já leu o pequeno jornal várias vezes, que retrata o espírito pleno de esperança que as gentes da terra viviam na década de oitenta, fruto também do trabalho, que o senhor Joaquim Mourão, jovem autarca e Presidente do Concelho de Idanha-a-Nova ia desenvolvendo com dinamismo “atento às carências dos lugares mais remotos e escondidos”.

Dos vários assuntos chamou-lhe a atenção o artigo sobre “O bodo ou festa de Monfortinho em Salvaterra do Extremo”

Não estando as páginas 5 e 6 em perfeito bom estado, as mesmas tratam da Origem e da Festa,

ORIGEM

A Senhora da Consolação adorada no lugar de Monfortinho, freguesia de Salvaterra do Extremo, atraíra a devoção da cristandade por dezenas de léguas em redor.

Não havia desgraça, contratempo ou aflição que, não podendo ser remediada pelo poder dos homens, não fosse levada aos pés da Virgem da Consolação em rezas e promessas.

Em certo ano – 1870 – segundo informação local, Maio de 1877 segundo Pinho Leal, os ubérrimos campos de Salvaterra foram invadidos por uma grande praga de gafanhotos.

Nem os ardores do sol estival, nem as aves que os devoravam aos milhares, lhes faziam dano apreciável. A praga indina não só roía o grão dos trigais como devorava as próprias folhas e rebentos das plantas. Maldição, diziam uns, castigo do céu lhe chamavam outros. Vá de prometer festa rija à Senhora da Consolação sempre tão solícita e bondosa, e procissão de penitência e bodo anual para ser servido a toda a pobreza e a quem mais o quisesse. Tudo saíria das ofertas de trigo, azeite, vinho e demais géneros que a terra livre da praga voltaria a dar com fartura.

A festa, a procissão e o bodo, deveriam realizar-se na segunda-feira depois do Domingo de Páscoa e a ser pagos com dávidas dos lavradores e pastores de toda a freguesia nomeadamente dos povos de Monfortinho, Torre e Carriçal.

A FESTA

Efectivamente até 1905, data em que os beneméritos Joaquim José Fernandes, por alcunha o canhoto, José Fernandes Moreira (meu bisavô paterno), João Gordo e José Folgado Moreira, o Branco, atendendo os protestos dos velhos que por sua idade ou achaques não podiam deslocar-se a Monfortinho, resolveram reconstruir sobre as ruínas da capela do Senhor da Pedra outra dedicada ao culto da Senhora da Consolação.

Quem todos os anos ao dealbar da segunda-feira referida percorresse as ruas de Salvaterra e dos povos anexos, notaria movimento desusado: os animais de tracção e os que davam cavalaria a serem engatados ajaezados ou aparelhados para se incorporarem na procissão e levarem as populações ao bodo a Monfortinho. Grande cortejo de cruzes, pendões, carros, carroças, cavaleiros e peões com a bandeira do Espírito santo à frente, seguia vagarosamente (que outra coisa não permitiam os velhos caminhos) a cumprir o voto, a rezar, a dar aos pobres e a todos os que quisessem servir-se, pão, caldo, carne e vinho com abundância.

Como a distância que separa Salvaterra de Monfortinho era comprida (18 quilómetros) sobretudo se tivermos em conta os meios de transporte do tempo os romeiros faziam um descanso no sítio do Vale do Pereiro.

Desatrelados os animais, abertos os sacos e os cestos com os farnéis, tudo comia e bebia, conversava e galhofava porque o vinho não deixava gorgolejar dos bocais das borrachas.

Costume curioso com cuja explicação não se atina, antes que se retomasse a marcha, os maridos com as respetivas consortes e os namorados com as namoradas, abraçavam-se, deitavam-se entrelaçavam as pernas e rebolavam desde o cimo até ao fundo do vale. As mulheres que por motivos especiais ou pelo seu feitio não desejassem tomar parte na brincadeira deveriam sentar-se antes que os maridos ou os namorados as abraçassem. Se não conseguiam sentar-se antes de ser agarradas, não podiam eximir-se à curiosa e velha prática.

TRANSFERÊNCIA DO LOCAL

Com a reconstrução da capela que fora do Senhor da Pedra a que já nos referimos, os Salvaterrenhos, roubaram, segundo é fama, a imagem de Nossa Senhora da Consolação aos de Monfortinho que passaram a adorá-la no seu novo templo e a fazer o bodo na Deveza de Salvaterra. Não obstante ainda hoje o bodo é conhecido por «festa de Monfortinho». Esta povoação não quis deixar perder a tradição e continuou por sua vez a fazer um bodo com as ofertas dos seus moradores três dias depois do de Salvaterra

BODO DE 1944

Neste ano de 1944. os Bodeiros juntaram para o bodo, além do azeite e carne de porco, 38 alqueires de trigo, 4645 escudos e cinquenta centavos em dinheiro, 72 rezes (cabeças de gado). Compraram 107 quilos de arroz, 715 litros de vinho, 7 litros de aguardente, 150 escudos e trinta centavos de tabaco.

Compareceram cerca de 1000 pobres e sobejaram 5 caldeiros de ensopado.

A ementa do almoço constou de tripas com arroz e fígado e pão, e a do jantar, arroz com carne, chouriço, toucinho, ensopado, pão e vinho à descrição.


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