domingo, 31 de dezembro de 2017

Um ano que acaba e outro começa. Saudades só do futuro. Este que esta a acabar e todos os outros sessenta e sete seus antecedentes serviram para aprender e guardar na memória as coisas boas e as menos boas, porque todas elas fizeram de mim o que sou hoje. Aprendemos mais com as derrotas e as dificuldades do que com as vitórias, por isso o ano civil que se presta para terminar não deixa saudades mas tão só registos, alguns bons e outros nem tanto.
Uma coisa me parece evidente, vou continuar as minhas viagens pela outra margem. Gosto, habituei-me e gosto de andar pela outra margem da vida, preservando a minha independência quase nem dou por andar em contra-mão.
Em contra-mão respeitando o sistema vigente, cumprindo com as obrigações a que um qualquer cidadão português esta obrigado, por vezes no limite mínimo, mas cumpro. Dou mais importância aos deveres e obrigações, do que aos direitos que nos são atribuídos nesta Democracia. Não quero com isto dizer que não seja defensor dos direitos consignados na Constituição. Sou-o de tal forma que não vejo nenhuma necessidade de a mesma ser alterada ou reformada como alguns gostariam. O que é preciso é saber lê-la, ter bom-senso, não ficar agarrado à letra da mesma, saber jogar dentro dos limites que ela nos oferece, por forma a que possamos caminhar para uma sociedade mais decente, onde os ricos possam continuar a ser ricos e os pobres cada vez menos pobres, que o fosso entre as classes mais ricas e as mais pobres, que existe neste final de ano civil se possa inverter com bom-senso.
Pela manhã o tempo continua cinzento. Com o dia a acordar também o vento ainda dormia.
Bom ano 2018!


Ontem última manhã de um sábado deste ano, apanhei o comboio suburbano com ideias de ir até Benfica, mas a meio do percurso mudei de ideias e fui até de Santa Apolónia. Manhã cinzenta com as nuvens a esconderem o sol e a não nos presentearem com um pouco de chuva para satisfação de todos os que passeavam pelas ruas de Lisboa. Passo a passo fui de Santa Apolónia até ao Terreiro do Paço, passando pelo Museu do Fado. O Cais das Colunas cheio de gente mas ninguém à espera do D. Sebastião embora o nevoeiro acompanhasse o rio até à foz.
A zona ribeirinha é uma atração para muitos dos visitantes. Depois de tantas polémicas por causa das obras de reordenamento começa a ficar bonita toda aquela zona até ao Cais do Sodré onde a praça também de se apresenta de cara lavada.
Olhei o relógio e ainda tinha tempo para subir a Rua do Alecrim. Há quantos anos eu não a subia? Quase tudo o que conhecia mudou para melhor. Pena a não identificação do que resta da muralha Fernandina após a construção dos prédios de habitação. Assim como a estátua do grande Eça de Queirós, tapada pelos carros da corporação de bombeiros.
Chegado ao Camões. À esquerda a Rua da Horta Seca e ao fundo já na Rua das Chagas o edifício onde por três anos estudei no Instituto Comercial. Agora já não existe o Polícia Sinaleiro para nos chamar a atenção quando atravessávamos as ruas a correr para irmos apanhar o comboio ao Rossio.
O Chiado continua animado, recuperando vida e sente-se a cidade.

Desci à Rua do Crucifixo para apanhar o metro e fazer o caminho de volta. Vou voltar mais vezes.

sexta-feira, 29 de dezembro de 2017


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Há janelas e janelas, todas com sua beleza, todas guardam histórias. Histórias que em silêncio, elas, nos transmitem quando as olhamos e as escutamos na linguagem muda que no instante se estabelece entre nós. Às vezes entram-nos na câmara mais coloridas outras nem tanto. É que nem todas as histórias têm a mesma a mesma cor, a mesma energia, o mesmo final feliz!
Contudo elas aí estão, todas com sua beleza, todas guardando histórias de vidas!

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Há caminhos e caminhos, há picadas, trilhos e veredas, há estrada e auto-estradas, HÁ de tudo um pouco
Há rios e rios, há ribeiros e regatos, mas muitos quase secos aguardando que chova para voltarem a ter alegria com a água da chuva correndo no seu leito sujo e ocupado por arbustos, ervas e elementos da poluição humana.
Há praias e praias, umas sem vento outras com vento, umas de águas mais cálidas e outras mais frias, umas com areia e outras quase sem areia, onde o mar nem sempre está de bons humores
Mas já não há jornais, rádios e televisões que falem e difundam as opiniões dissonantes do poder vigente

Ainda há um ou outro sobrevivente que na rádio que num ou outro jornal continua a remar contra a maré, solitário em aguas revoltosas incomodadas pela sua presença, pela sua teimosia
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Estou a ficar louco é a sensação que tenho. Há muitos anos que vou vivendo em contra mão com o regime vigente sem eu ser anarquista, antes pelo contrario, defendo a aplicação da ordem e da lei igual para todos, desde que esta não seja como o queijo suíço (cheia de buracos para alimentar amigos e conhecidos).
Ontem senti um vazio enorme no peito, depois de almoçar um bom arroz de polvo a saber a mar penicheiro, porque queria ligar-lhe, saber se esta tudo bem com ele, mas ele já não tem número de telefone ... e assim fiquei com o meu aparelho na mão a olhar e a sentir o vazio da lembrança no peito. Agora só as lembranças dos quatro que éramos… É a vida, eu e o mano cá vamos andando.

Desço a escadas não vou de elevador. Tenho medo de sentir mais uma vez o seu cheiro no elevador como que a dizer-me que também ele esta vivo numa outra dimensão. Nunca teve telemóvel. Desde que o trouxe da rua para junto de mim, nunca mais nos separamos sempre atentos um ao outro. “Não me deixes sofrer” foi o seu pedido enquanto dormíamos e não sei se no meu egoísmo de te manter vivo não estavas já sofrendo. Mas, depois por vezes subo pelo elevador.
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Ao estarmos a falar das dores sentidas quer na coluna quer nos braços e dedos veio à ideia o anúncio que passa na TV oferecendo a solução “milagrosa” de com uma simples espécie de meia na perna as dores poderem desaparecer. Será? Talvez sei lá!
Depois de me ter livrado do ataque de zona, os médicos disseram-me que iria ter dificuldades na locomoção do braço direito, dificuldades que poderiam durar um ano ou mais. Não totalmente convencido fui a uma osteopata que me deu esperança e com uma ou duas sessões mais o exercício de limpar o pó me devolveu a mobilidade ao braço.
Já lá vão uns cinco anos quando sofri uma intoxicação alimentar. Naquela tarde de sábado relembrei-me do que era vomitar. Nada podia cair no estômago que logo saía. As dores acompanharam o sono e no domingo a cena durou o dia todo. Insistia em beber água e o organismo insistia em rejeita-la. Na segunda feira tinha uma visita às instalações dos serviços sociais da polícia na Praia de Vieira e depois na Praia do Baleal. Meti-me a caminho resistindo. Depois da visita na Praia da Vieira ao passar pela Marinha Grande cheio de fome e de sede comprei umas bolachas e uma garrafa de água que ia bebendo golo a golo devagar. Entre a Serra del rei e a Atouguia da Baleia, no IP6, parei e lá foi tudo borda fora. Consegui chegar a casa sem forças para passar no Centro de Saúde. Completamente em baixo, resolvi deitar-me e colocar todos os anéis wellan2000 que tinha comigo por cima do estômago e do intestino. Levantei-me só para ir à rua com o meu amigo e dar-lhe de comer, voltando para a cama com o peso dos anéis em cima de mim.
Porque os anéis? Se os bio sinais emitidos pelos anéis actuam sobre as moléculas da água ajudando a melhorar a qualidade desta e se o corpo humano é mais de dois terços compostos de água, porque não experimentar? As dores e o mal estar já eu tinha… urgências centro de saúde ou hospital… queria era ter forças para depois poder então ir se a coisa continuasse.
Um resto de tarde e uma noite com os anéis em cima chegou e quando no dia seguinte me levantei para ir passear o Master nada de dores, nada de má disposição e as forças normais. Ainda a medo tomei o pequeno almoço que foi aceite pelo organismo. Milagre? Não! Mas, comigo foi assim e ninguém me tira do pensamento que os anéis Wellan2000 com os seus bio sinais me ajudaram e muito a ficar bom, sem cápsulas ou suspensões orais.
Contudo, longe de mim por em causa o saber, o humanismo e o profissionalismo dos médicos e da medicina convencional. Mas, assim como há mais vida para lá do orçamento, também o saber na saúde não se limita só à chamada medicina convencional.

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Oferecem-me um livro para ler sobre casos de “premonições” que vão acontecendo no nosso planeta, nas nossas vidas.
Sabes? O que um autor mais ou menos famoso escreveu num livro é de ter em atenção, mas quando eu falei daquele nosso sonho em que tu me disseste: - não me deixes sofrer! Isso são tonterias minhas para acabar mais depressa a nossa relação de amizade.
Quando ao fim destes quatro meses em que o teu sofrimento teve fim e digo que por vezes desces comigo no elevador, é o que?
Como disse o pai de um grande escritor português, “na natureza o nada não existe”! É certo que o ter a sensação de estares ali no teu canto atento aos meus movimentos vai perdendo força, mas às vezes ainda desces comigo no elevador.
O meu outro amigo, antes de ti, acabou o seu sofrimento a 19 de Fevereiro e tu a 14 de Outubro. Esqueço datas de aniversários, de acontecimentos importantes na minha vida, mas não esqueço estas duas datas da perda de amigos fieis, porque?
Eu, que em criança me borrava de medo quando via um cão e foi só lá longe no Mumbué que comecei a perder o medo quando em pelo menos duas operações eram mais os teus amigos em operação do que soldados operacionais.
Onde estiveres que estejas bem, que possas ter uma vida melhor do que aquela que tiveste por cá até nos conhecermos. Não estejas nem fiques em cuidados por minha causa, eu vou aprender a defender-me. Talvez mais para a frente encontre outro companheiro como tu foste… talvez… não será igual a ti mas será um bom companheiro…




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Sabes o que me dói?
Não, não é dor física, nem é uma dor constante, chega normalmente nos finais das tardes de sábado ou de domingo. O tempo passa e com o tempo vai passar, eu sei, mas que hei-de eu fazer se nas tardes de domingo o telemóvel já não toca e a dor, a angustia se instala pela ausência de te ouvir perguntar se esta tudo bem e as meninas como estão? Às vezes a conversa durava pouco mais de 30 segundos, que tu nunca foste de grandes conversas ao telefone. Ah como hoje sinto a falta desses segundos, tão curtos e tão ausentes. Até quando esta angustia vai permanecer ou voltar todas as tardes dos fins de semana…
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Depois de andar um ano a correr atrás de ti, lá consegui ao fim de 351 dias ficar com a mesma idade que tu. Mas ao fim de 14 dias deixas-me outra vez com um ano de diferença. E, assim sendo tu o mais velho lá vou eu recomeçar a correr atrás de ti. Apanho-te em Dezembro para logo em Janeiro te adiantares com a tua pedalada certa, obrigando-me sempre a correr atrás de ti.
Que a saúde não nos falte para assim podermos continuar, até quando não sabemos, mas ambos temos vontade e esperança que possamos andar neste corre e foge por um bom par de anos mais.
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Há quantos anos não pisava a areia de uma praia na Costa da Caparica? Tantos foram que o tempo se perde na memória.
É pena que aquele extenso areal ter um mar assim a modos que ciumento e traiçoeiro. Tanta gente na praia passeando e aproveitando a excelente manhã, mas tão pouca gente dentro de água nadando desfrutando da beleza que a natureza nos oferece. Até a minha “peixinha” ficou receosa porque mal entrou na água, logo um senhor a aconselhou a não ir mais para dentro, não fosse algum agueiro aparecer.
Muito bom o areal mas prefiro rumar a norte lá para os lados de Peniche, do que passar a ponte para a outra margem
Neste mares navegados por gentes, barcas e deuses
Nestes feixes de virtuais a caminharem para reais
Acordei um dia e senti um sabor estranho nos lábios
Quis saber o que era... Perguntei ao deuses e eles se riram... Caminhei... E junto ao farol olhei o mar... Perguntei ao vento notícias de tal sensação... E o vento nada me disse...
A brisa que soprava não sabia a maresia...
Era de rosas o seu cheiro seu sabor...
Icei as velas do pensamento e parti...

Em busca da bruma que me tinha visitado e tal "doce" poisou em meus lábios…



As filhas que filhos não procriei. Não sei se castigo dos deuses ou se destino traçado. Não me importo, criei-as como o meu saber me permitiu. Nunca fui habituado nem aderente de «modernices educativas» Conservador mas estudioso. Bati quando tive que bater na certeza que chorei mais lágrimas secas do que elas simples lágrimas. Ainda hoje, penso que quando eu era jovem só se perderam as palmadas que meu pai ameaçou e não me deu. Duas filhas, duas irmãs bastante diferentes em quase tudo mas duas filhas minhas.
No alto da pequena duna que o progresso se encarregou de desfazer, olho o mar, o horizonte de tantas esperanças e de alguns medos de então. A guerra no mato em Angola me aguardava e ali estava eu na minha praia em curtas férias a pensar no que fazer à vida. A Consolação com as suas dunas, com o seu mar e o horizonte lá ao fundo distante, alimentava-me a esperança e a crença do que a vida me ia proporcionar… ali as paredes não tinham ouvidos e o sonho comandava a vida... mas como iria eu despedir-me de meus pais, uma duvida e um medo que nunca resolvi… só o meu irmão e os primos da Azambuja me acompanharam na despedida clandestina naquela noite no Figo Maduro. Ali, naquela praia de areia grossa, de águas frias e ondas fortes, com nortada ao final da tarde, vivemos, crescemos e fomos felizes!
Olho para ti
Abraço-te pela manhã
Todos os dias, todas as noites
Porque as noites também têm manhãs
Mas nem sempre tu me abraças
Olho para ti e vejo aquilo que não somos
No meu olhar te vejo qual musa, qual deusa
No meu pensar as palavras bailam sem saberem dançar
Podíamos ser felizes
Porque é que com o passar do tempo, dos dias e anos, só por momentos cada dia mais ténues nos abraçamos com o desejo da permuta?

quinta-feira, 28 de dezembro de 2017



O tempo voa na sua constante, passa indiferente à divisão que a ciência dos homens estabeleceu há séculos lá para trás do tempo. 

Ainda em algumas mesas se consomem as iguarias festivas da noite de Natal, já o mesmo foi esquecido, passou à historia. Os Pais Natal foram-se, pelo que devem estar a aquecerem-se na imaginaria Lapónia, já não se enxergam por cá. Agora há que preparar as mentes humanas para a passagem do ano civil. Hábitos a que nos habituamos sem compreender bem o porque de tanta festa, de tanta euforia, já que o tempo não muda, não desacelera, nem acelera. O tempo nada nos traz, somos nós que o preenchemos, que o tornamos mais leve ou mais pesado, mais colorido ou mais negro.
São só apenas doze badaladas e parece que o mundo muda no instante seguinte, que com elas terminam as guerras e os ódios, acaba a exploração do homem pelo homem, que por causa das doze badaladas o ciúme morre deixando de existir a “violência doméstica” entre os casais, os namorados e até nos separados e divorciados. Como se com as badaladas que anunciam o novo ano, as televisões deixassem de ser submissas ao capitalismo avaro, e se tornassem veículos de educação e motivação positiva dos seus ouvintes; nas cidades os vizinhos passassem todos a cumprimentarem-se quando se encontram, nas vilas e nas cidades deixasse de haver veículos estacionados em cima dos passeios para os peões; os humanos que passeiam os seus cães nas ruas e nos jardins passassem todos a utilizar o saco de plástico para acondicionarem os dejetos dos seus animais. Como se no dia seguinte às doze badaladas os políticos deixassem de fazer tantas promessas irrealizáveis e utópicas; no trabalho a lei principal passasse a ser o “bom-senso” entre os trabalhadores, sindicatos, administradores e patrões; por último, para não ser maçudo, que o Estado com os seus funcionários, trabalhadores, colaboradores, directores, assessores, consultores e Ministros, passasse a ser uma “Pessoa de Bem”, cumpridor dos seus deveres para com os seus cidadãos, duro com os prevaricadores das regras e da ordem institucional por forma a deixar a imagem de um Estado forte com os pobres e desprotegidos mas fraco com os poderosos do capital.
Por mim já há uns dias que mudei de ano acrescentando mais um digito à soma dos anos.
Para os que gostam de viver a ilusão da passagem de ano, e para os indiferentes como eu, desejo a todos que a vida corra mais leve e mais colorida em 2018 do que nestes últimos anos da nossa existência colectiva.

Foste-te embora à quase vinte anos. A vida ficou mais vazia, sempre presente o frio da tua da vossa ausência. O Natal deixou de ser o nosso Natal desde que sofreste aquele “avc” que te deixou marcas inultrapassáveis, passou o Natal já nesse tempo a ser uma data, uma festa consumista onde respondemos aos estímulos que a cada minuto o sistema nos martela a visão e os ouvidos. Vivemos hoje um Natal prostituído cheio de luzes mas vazio e frio, e vive-mo-lo sem darmos conta disso. A simples noite de festa pela celebração do nascimento da Esperança na Paz, na Justiça e na Solidariedade entre todos os humanos, configurada na imagem do Menino Jesus transformou-se em muitas coisas sem Esperança, coisas ditas em palavras vazias de sentimentos mas muito bonitas quando soletradas, ditas em conjunto.
Sabes mãe, depois que o pai também se foi desta viagem, o sentido desta data mudou ainda mais, apenas as netas e o neto me animam a fazer algumas das compras para lhes oferecer.
Ainda agora cheguei da rua depois de fazer a minha caminhada das sete. Assim como vocês tinham os gatos que andavam pelo palheiro, também eu criei laços com um gato de rua que à nossa porta vem comer todas as tardes-noites e todas as manhas quando o dia esta para nascer, à hora mais ou menos certa la esta ele aguardando que lhe seja servida nova refeição. Sabes, as vezes ficamos os dois a olhar um para o outro, mas não sou capaz de ler o que lhe vai na alma, talvez ele compreenda melhor o meu olhar, por isso não fugindo de mim não se deixa apanhar, nem tão pouco me permite fazer-lhe festas, ainda hoje logo pelas sete lhe disse que era Natal, mas ele impávido e sereno só quando fiquei a um passo ele deu dois passitos atrás para ficar a coberto do carro que ali estava estacionado.
Sabes, nas ruas desta cidade as pessoas que por por cá habitam não colocaram este ano tantas luzes nas varandas, não vejo tantos bonecos de Pai Natal a subirem pelas paredes, nem tão pouco as bandeiras com a imagem do Menino Jesus que os católicos mais praticantes colocam nas suas janelas e varandas em oposição ao Natal do Pai Natal. Uns e outros disputando uma data, uma festa, não sei se um sentir, um desejo de Esperança na Paz, na Justiça, na Solidariedade.
Lembro com alguma saudade pela vossa ausência, os nossos Natais simples como vocês sempre souberam viver e nos ensinaram.

sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

Para trás tinha ficado Luanda e todo o caminho que no dia vinte e um fizemos até chegarmos ao RI20 em Nova Lisboa, onde pernoitámos para voltarmos a sair de madrugada rumo ao nosso destino. À medida que caminhávamos para leste a paisagem ia-se modificando, às terras avermelhadas de Luanda andávamos agora por terras arenosas onde mata que circundava a estrada era mais aberta. Não me lembro do almoço. Ainda Nova Lisboa estava no horizonte quando dei por lá ter deixado o relógio que a minha avó me tinha oferecido por ter feito o exame da quarta classe e o de admissão à escola industrial e comercial de Peniche. Pelo caminho passámos na sede do Batalhão, onde me senti contente por o Comandante de Batalhão ter perguntado ao Capitão de Companhia quem era aquele Alferes. É que desde a primeira palestra que nos deu à sua chegada ao BC10 em Chaves, nunca mais me apanhou numa das suas reuniões com os oficiais, ou porque estava de serviço ou porque me baldava ou porque não gostava de dar nas vistas passando a minha existência despercebida ao mesmo senhor. Depois dos cumprimentos seguimos caminho rumo a sul até ao Mumbué onde os camaradas da Companhia que íamos render estavam em festa e nos receberam em festa, cantando,dançando, tocando música com os pratos e talheres, não houve nem foguetes nem tiros mas a alegria deles era inversamente proporcional à nossa apreensão.
Depois de arrumados os soldados do meu grupo, sozinho no meio daquela euforia toda, sentei-me na mala que tinha levado e voei para o colo da minha mãe, as lágrimas vieram e os porquês do que estava ali a fazer eram mais que muitos. Naquele dia, há quarenta e cinco anos, fazia este jovem os seus vinte e dois anos de vida e de sonhos. E ali estava ele sozinho com a sua mala, os seus livros, cassetes e a sua G3 a olhar num olhar vazio de incompreensão da festa que o rodeava, até que alguém o veio chamar e o ajudou a levar as coisas para a messe dos oficiais.
Memórias, hoje vividas sem tristeza, porque não é por ter passado o que passei, por ter vivido o que vivi e não ter vivido o viver dos meus sonhos de juventude, que sinto tristeza, ou revolta. A vida é uma função de experiências cumulativas, umas melhores, outras piores, mas todas nos servem para podermos aprender e apreender os significados de tais factos e momentos. Fui jovem e voltei homem. A 22 nasci. A 22 cheguei ao Mumbué e a 22 dois anos mais tarde passei à disponibilidade. Dizem os da numerologia que o meu numero é o 22, talvez seja.
A partir de hoje, o meu sonho grisalho é poder viver com qualidade de vida até à inversão da ordem dos números de vida que já tenho!

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

E a UBER já ganhou.
Podem juízes e especialistas tecerem e discutir argumentos cá pelo burgo, contra a actuação da empresa que ela já venceu em Bruxelas, ao ser considerada no tribunal europeu como uma empresa de transportes.
São estas pequenas coisas, estes pequenos casos, como a uber, os herbicidas e até a própria lei da água, que me dizem e demonstram quais os verdadeiros interesses dos burocratas que, pela fraqueza ideológica e humanista dos políticos que ocupam os lugares na comissão e no parlamento de Bruxelas, actuam ao serviço dos grandes oligopólios em nome de uma União (mais fachada de interesses oligopolistas do que realidade e bem estar social dos povos) nos impõem doucement a troco de uns subsídios, para que nos possamos ir entretendo a discutir que obras vamos proporcionar ao sistema financeiro, enquanto eles nos vão tratando da saúde.
A democracia e o capitalismo são estádios imprescindíveis no desenvolvimento social e no nível de vida dos povos europeus. Contra factos não há argumentos. Mas, para onde nos levam os burocratas de Bruxelas? A quem servirá as medidas tomadas nesse tal tribunal europeu?
Por este caminhar, só falta algum iluminado propor e o dito tribunal decretar que o ar que respiramos deixa de ser um elemento da natureza e passa por decisão superior a ser considerado na legislação europeia um bem, e como tal, sujeito a poder ser privatizado para júbilo de uns quantos amigos detentores dos meios de controle.

Entretanto enchemos as estradas da comunicação virtual com as viagens, com as prendas e desejos do Pai Natal consumista, com mensagens de um Feliz Natal, como se a Felicidade fosse coisa fácil ao alcance de qualquer um de nós e de todos, só pelo simples facto de ser desejada e nos encomendada por familiares e amigos.

segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

 

Não há sofrimento ao vasculhar na memória tempos de juventude, de sonhos e preocupações, até porque a «nossa guerra» não foi felizmente muito traumatizante, o chamado «inimigo» andava dividido, desorientado o MPLA com as dissidências provocadas pela Revolta Activa, a UNITA do Savimbi vivia numa paz podre com as «autoridades portuguesas» e a FNLA no leste não tinha influência.
Recordar sem sofrimento. Recordar como fomos jovens e voltamos todos já homens. Crescemos, nos fizemos homens sofrendo sim, quando por lá andámos guerreando sempre com o medo de uma mina na picada do Cuvelai, ou de uma emboscada ocasional, com a tensão que a PIDE-DGS nos criava nas suas operações com os Flechas a encontrarem quase sempre armas escondidas, quando nós não as encontrávamos em operações nos mesmos locais, até ao dia em que dissemos ao nosso capitão que era bom sabermos os números das mesmas armas; com o medo e a tensão vivida nas terras do Munhango quando nos mandaram ir atrás do «turra» Savimbi e aí sim, a guerra, a ansiedade, as preocupações e o medo, foram vividos a cada segundo em cada minuto daquele mês, que alguns de nós por lá vivemos. No abastecimento da água para a base, nas operações, sentíamos sempre os «olhos do inimigo» a vigiar os nossos passos, com a tensão a bater forte quando atravessávamos a pé, com a água até ao pescoço dos saldados mais pequenos, o rio Lungué-Bungo de águas correntes e cristalinas que de tão cristalinas metiam respeito e medo aos que não sabiam nadar. Operações houve que da ração de combate só os sumos e a salada de fruta se puderam comer, uma vez que nem fogo podíamos fazer para tentarmos esconder a nossa posição, valeu-nos a mandioca e os produtos hortícolas crus que íamos encontrando nas lavras que o pessoal controlado pelas tropas do Savimbi por lá tinham bem amanhadas.
Vivi a ditadura salazarista-marcelista com a bênção dos poderes religiosos, já na oposição, fui à guerra consciente de que também se podia combater por dentro o próprio regime decadente mas sempre ditatorial; depois, vivi a alegria da Liberdade condicionada em Angola não se sabendo como ia ser o futuro da região. Vi militares de carreira passarem de defensores acérrimos de um Portugal do Minho até Timor, a serem mais mais democratas revolucionários que o Movimento dos Capitães, a que se diziam pertencer desde a hora anterior à sua génese. Vi e ouvi o “pide” Jacinto com ar de santinho dizer numa reunião na sede de Batalhão no pós 25 de Abril, que eles pides sempre souberam que na companhia do Mumbué havia “comunistas”, dizia-o olhando para mim, e que eles nunca tinham mal tratado ninguém (eles que alguns meses antes tinham furado os ouvidos com paus incandescentes a um guerrilheiro do MPLA que os Dragões de Silva Porto tinham capturado numa operação em que lhes dei apoio logístico no Chinhondze). Santinhos aquelas duas personagens da Catota. Nomeado como o oficial da companhia para acompanhar os guerrilheiros da UNITA, agora em acção psicológica pelos quimbos da nossa zona, vi a alegria das populações quando lhes apresentava o Capitão da UNITA . Populações onde o soba apenas nos tinha respeito, talvez por medo da tropa, dizia agora nessas acções, às suas gentes para oferecerem também à tropa, uma cabeça de gado e foi assim que quando abandonei o Mumbué ainda lá deixei perto de 20 cabritos.
Agora, irei comprar o livro sobre a “Descolonização” de um militar de carreira e do Movimento dos Capitães quando no pós 25 de Abril em Silva Porto, os militares que comandavam o sector nos deram ordem de prisão quando integrando uma comissão ad hoc quisemos evitar a saída do batalhão de Chitembo para Maquela do Zombo, sem êxito, diga-se.
Na guerra aprendemos a ter como amante a nossa G3, deram-ma no Grafanil e no final da comissão foi lá que a deixei. Uma amante fiel que nunca reclamava, nem chorou quando a deixei. Até à pouco tempo ainda me lembrava do numero que ela tinha. Era uma amante que dormia sempre connosco, sempre pronta a defendermos-nos. Em comparação com a famosa kalashnikov russa, disseram-me os entendidos dos Dragões de Silva Porto (homens de cavalaria que faziam as suas operações militares montados em cavalos puro sangue sul-africano), que embora mais pesada, a nossa G3 era mais certeira a 200 metros, causava mais estragos no desgraçado que fosse atingido por um tiro de G3 do que de uma kalashnikov. Nunca experimentei e assim não sei se era verdade ou não. Apenas numa emboscada que a UNITA nos montou, dei uso no teatro das operações à minha G3. Nessa emboscada depois do «inimigo» ter fugido, não ficamos lá todos ou muitos, porque fomos protegidos por uma estrela celeste salvadora. O “fdp” do Savimbi nunca foi capturado, mas à boa maneira dos ditadores quando estava sem alternativas de fuga, aproveitou o 25 de Abril e voltou a negociar um acordo de paz com as autoridades portuguesas em Angola.
Reconheço sem problema, que dos três movimentos que em Angola nos faziam «guerra de guerrilha», nutria alguma simpatia pelo MPLA. A figura de Agostinho Neto impunha-se à de Savimbi ou à de Holden Roberto. Mais um equivoco que a história se encarregou de me demonstrar que estava errado. Nenhum dos três após os acordos de Alvor com as autoridades portuguesas se preocupou com o bem estar e o desenvolvimento do povo angolano, antes só procuraram impor os seus interesses de poder ditatorial, com o MPLA a dominar e a exercer sobre todos os que se desviassem da sua linha de pensamento os métodos mais duros das policias secretas ditatoriais. Por onde andará o antigo cabo estrábico Vieira Dias?
Não há pois tristeza ou sofrimento doentio, neste recordar de experiências por vezes com medo, outras mais ou menos doridas e vividas. Apenas o recordar como felizmente os tempos mudaram e os jovens que hoje partem para missões militares no estrangeiro fazem-no não porque são obrigados mas porque se oferecem para tais operações, vão ao que sabem e porque nelas desejam  participar.
Não é por ter passado o que passei, por ter vivido o que vivi e não ter vivido o viver dos meus sonhos de jovem, que sinto tristeza, ou revolta. A vida é uma função de experiências cumulativas, umas melhores, outras piores.
Uma coisa é certa, mais “chicalhão”, mais “controlador”, mais “baldas”, sempre procurei defender o meu grupo, nem sempre da forma mais correcta, cumprindo sempre no limite mínimo as obrigações que me foram confiadas. Dentro dessa certeza estão os laços de amizade e de respeito com todo o pessoal do Batalhão em geral, mas de uma forma mais especial com os jovens, os homens, os grisalhos de hoje da 2ª C. Caç. 5010. Há laços que nasceram sem darmos por isso e que se tornaram tão fortes que não há política ou futebol que os vença.
Outra coisa é certa mas mais difícil de entender, de explicar até, é o sentimento de nostalgia, de amor mesmo, aquela terra onde andámos na guerra mas que deixou esta sempre vontade de um dia lá poder voltar e ir ver e sentir as populações por onde andámos. Uma terra tão abençoada, tão grande e onde tantos continuam a viver à margem dos limites da dignidade humana.
Um Natal de 2017 com saúde e boa disposição para todos os antigos combatentes do Batalhão de Caçadores 5010/72.
O mesmo, ou seja, “Um Natal de 2017 com Saúde e Boa Disposição”, para todos os amigos que fui criando ao longo da vida, quer andem por estas auto-estradas, quer vivam fora delas!

domingo, 17 de dezembro de 2017



Mais um dia nesta viagem. Mais um recomeçar tudo de novo vivendo dia a dia como sendo o primeiro do resto que tenho para andar. Olhando e escutando o interior, perguntando à sombra se ela me pode dizer mais alguma coisa mais do que aquilo que os dois em um sabemos.
As noites passaram a ser um pouco diferentes, não que nos custe, a mim e à minha sombra, o adormecer inicial, um ou dois minutos nem tanto para passarmos pelo subconsciente e mergulharmos nas profundezas do inconsciente, deixando-nos por lá ficar. Apenas o ressonar alterando o compasso da respiração dá sinal de vida.
Contudo, agora, o levantar para o urinar nocturno, como que me acorda não permitindo que recolocado o corpo na horizontal possa de imediato voltar ao universo inconsciente. À mente acordada chegam aos trambolhões ideias, pensamentos e medos que procuro evitar mandando-os embora. Contudo o relógio da sala vai batendo as meias e as horas até que por fim lá me encontro a navegar no subconsciente à tona d’agua aguardando a chegada das sete para sair de casa, olhar pelo meu amigo gato de rua que me aguarda a fim de tomar o seu pequeno almoço, seguindo depois a minha caminhada até por volta das oito.
A vida é feita de pequenos nadas e agora também, de pequenas e grandes dúvidas face aos caminhos alternativos que a ciência nos oferece.
E, como hoje somos o somatório acumulado de experiências, vivências e decisões tomadas ao longo da vida passada, sorrio lembrando-me que foi mais fácil a decisão de escolher o trilho que evitou um dia ter o grupo de combate caído na emboscada que a UNITA nos montou, do que escolher um destes trilhos alternativo agora propostos.


Para o meu pai a oliveira era como que uma árvore sagrada, era o seu Deus no feminino, que resiste aos tempos de estiagem prolongados, que pode viver várias gerações, bastando apenas que de tantos em tantos anos, sejam os seus ramos e troncos limpos para nos anos seguintes voltar a sentir-se feliz com a doação dos seus frutos aos humanos.
E o exemplo que elas nos dão como que se fundiu nas populações do interior que delas dependiam para o seu sustento.
A batata, o grão, as couves da horta plantadas em Agosto para poderem estar na mesa pelo Natal, uma açorda de pão, alho e salsa com um ovo escalfado ou umas migas de batata da minha avó (apenas e só batatas às rodelas cozidas com água dos poços, uma farinheira e uma folha de louro), tudo ganhava e ganha outro sabor, outra força, outro sustento quando o produto da terra é regado a preceito com o azeite extraído a frio do fruto das oliveiras.
Oliveiras, azinheiras e sobreiros davam e dão sombra e abrigo aos animais de pastoreio. As bolotas que caiam e caem para o chão, as azeitonas que ficam esquecidas nas árvores alimentam animais e aves, dando as bolotas um sabor especial à carne e ao toucinho do porco, mesmo quando eram criados nas furnas que rodeavam as aldeias.
Oliveiras, azinheiras e sobreiros povoam os campos pobres aguardando que do céu caia a bendita chuva que sempre tarda a chegar. Elas, os homens que trabalham a terra e os animais que nelas vivem, olham os céus que de azul celeste vestido, mas triste e dorido pela falta da água que se deve ter perdido em algum engarrafamento celeste.
Oliveiras, azinheiras e sobreiros, assistem tristes às nuvens de pó que os tratores produzem ao lavrarem a terra ressequida pois há que lançar as sementes à terra. Agora, homens, árvores, animais, terra
e sementes todos na esperança que o céu deixe o triste azul e volte a colorir-se de nuvens carregadas de água, para que esta possa cair bem temperada e tudo renasça de novo na Natureza.
Enquanto isso, nas cidades, nas televisões e rádios, papagaios falantes pagos alguns a peso de oiro, dão-nos com ar de satisfação desmedida a continuação do falso bom tempo. Será que é nos corpos ao sol que ainda se expõem nas praias que está o futuro ecológico e sustentável?
E, tudo isto em nome de quê? De que progresso? De que Futuro?