domingo, 17 de dezembro de 2017

Se ontem, dia quinze, fez quarenta e cinco anos que parti naquele que foi o meu baptismo de voo, hoje faz precisamente os mesmos quarenta e cinco anos que pisei pela primeira vez as terras de cor avermelhada de Luanda. Para trás tinham ficado a minha mãe e o meu pai de quem não tivera a coragem de me despedir. Pelo caminho quer no comboio quer na viatura militar vi a casa onde os meus pais moravam nos Olivais Sul, a minha casa até ao dia em que me apresentei em Mafra para o serviço militar. No aeroporto nas despedida apenas o meu irmão e os primos de Azambuja. Ao subir as escadas para o avião voltei atrás e numa ultima despedida de meu irmão disse-lhe «se eu morrer já sabes o que tens a fazer». Depois no fundo da memoria vejo a aproximação do avião à costa e em seguida à pista e não encontro memórias de como fomos do aeroporto para o Campo do Grafanil, apenas me recordo de no final da tarde já na cidade procurarmos onde dormir. Grafanil um entreposto enorme de milhares de militares em transito, onde a alegria dos que deixavam o território se sobrepunha à apreensão dos “maçaricos” nos seus camuflados novos, sem compreenderem bem o que estavam ali a fazer naquela terra onde tudo parecia estranho e pouco acolhedor. Uma vaga ideia de que pela manhã apanhávamos uma viatura que nos levava para o Grafanil onde e como não me lembro. No Grafanil passávamos o tempo até voltarmos no final do dia à cidade, para à noite fazermos o circuito dos bares nocturnos da noite de Luanda onde as “pequenas” sentindo que éramos novos na cidade se sentavam ao pé de nós e nos falavam de queridos para que lhe pagássemos uma bebida e ou algo mais. Não me lembro sequer como e onde almoçávamos. Lembro e recordo os rissóis de camarão e o sumo de maracujá que comia e bebia na baixa de Luanda, em frente à cervejaria Portugália, onde à vista de todos as mulheres faziam o cambio dos escudos em angolares. Chegamos a dezasseis de Dezembro e meio perdidos por lá andámos até à madrugada do dia 21, quando já com os elementos que recebemos do recrutamento local pertencentes ao RI21 nos colocaram em cima de camionetas civis e partimos rumo à zona militar leste. No Mumbué outra companhia nos esperava ansiosos pela nossa chegada. À alegria deles correspondia a nossa apreensão.
Hoje, ao olhar para trás e ao relembrar as condições que nos eram oferecidas impostas, mas que, com sacrifício e ordem soubemos minimizar e humanizar, não sou capaz de ver como seriam as mesmas noticiadas pelos papagaios televisivos nos dias que correm.

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