Se
ontem, dia quinze, fez quarenta e cinco anos que parti
naquele que foi o meu baptismo de voo, hoje faz precisamente os
mesmos quarenta e cinco anos que pisei pela primeira vez as terras de
cor avermelhada de Luanda. Para trás tinham ficado a minha mãe e o
meu pai de quem não tivera a coragem de me despedir. Pelo caminho
quer no comboio quer na viatura militar vi a casa onde os meus pais
moravam nos Olivais Sul, a minha casa até ao dia em que me apresentei
em Mafra para o serviço militar. No aeroporto nas despedida apenas o
meu irmão e os primos de Azambuja. Ao subir as escadas para o avião
voltei atrás e numa ultima despedida de meu irmão disse-lhe «se eu
morrer já sabes o que tens a fazer». Depois no fundo da memoria
vejo a aproximação do avião à costa e em seguida à pista e não
encontro memórias de como fomos do aeroporto para o Campo do
Grafanil, apenas me recordo de no final da tarde já na cidade
procurarmos onde dormir. Grafanil um entreposto enorme de milhares de
militares em transito, onde a alegria dos que deixavam o território
se sobrepunha à apreensão dos “maçaricos” nos seus camuflados
novos, sem compreenderem bem o que estavam ali a fazer naquela terra
onde tudo parecia estranho e pouco acolhedor. Uma vaga ideia de que
pela manhã apanhávamos uma viatura que nos levava para o Grafanil
onde e como não me lembro. No Grafanil passávamos o tempo até
voltarmos no final do dia à cidade, para à noite fazermos o
circuito dos bares nocturnos da noite de Luanda onde as “pequenas”
sentindo que éramos novos na cidade se sentavam ao pé de nós e nos
falavam de queridos para que lhe pagássemos uma bebida e ou algo
mais. Não me lembro sequer como e onde almoçávamos. Lembro e
recordo os rissóis de camarão e o sumo de maracujá que comia e
bebia na baixa de Luanda, em frente à cervejaria Portugália, onde à
vista de todos as mulheres faziam o cambio dos escudos em angolares.
Chegamos a dezasseis de Dezembro e meio perdidos por lá andámos até
à madrugada do dia 21, quando já com os elementos que recebemos do
recrutamento local pertencentes ao RI21 nos colocaram em cima de
camionetas civis e partimos rumo à zona militar leste. No Mumbué
outra companhia nos esperava ansiosos pela nossa chegada. À alegria
deles correspondia a nossa apreensão.
Hoje,
ao olhar para trás e ao relembrar as condições que nos eram
oferecidas impostas, mas que, com sacrifício e ordem soubemos
minimizar e humanizar, não sou capaz de ver como seriam as mesmas
noticiadas pelos papagaios televisivos nos dias que correm.
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