O
Fazedor de Cercas. Um livro que comprou sem saber bem porquê. Talvez
o título, lhe tivesse despertado curiosidade, chamando a sua
atenção. Talvez fosse o nome Andrade, do autor.
Outros
livros mandou vir da livraria que não conhece. Livraria em Coimbra
que o seu irmão lhe indicou. Também ele compra lá os seus livros.
Gente que se viu no desemprego e correndo riscos arriscou num
universo dominado pelas grandes editoras e cadeias de livrarias
transformadas em distribuidoras, onde se vende muita porcaria. Há
que ser solidário com os mais pequenos que precisam.
Ao
ler vai tomando notas. Vai escrevendo à mão num caderno pautado as
palavras, as frases que lhe enchem o gosto. Frases como: "... e
deixou-se ir pela veredas da sua própria paz", "Tudo o que
é, ensina amor" ou ainda "... a chuva escorria-lhes no
rosto com sabor a Céu". Coisas pequenas que lhe vão enchendo o
gosto e o ensinam a aprender a conhecer.
Sozinho
com a sua amiga fiel, prepara-se para regressar aos arrabaldes da
cidade grande. Ainda não partiu e já sente saudades da sua casinha,
do seu quintal, deste seu mundo pequeno e tão grande.
Levanta-se
para buscar umas azeitonas e beber uma outra mini. O ar está quente,
abafado como diria a sua mãe. O céu todo cinzento. As frentes
meteorológicas, as suas altas e baixas pressões a condicionarem o
clima fazendo chegar pelo ar poeiras do deserto.
Ele
que sempre foi mais de beber vinho tinto, com o calor raiano vai-se
habituando a beber vinho branco fresquinho ao almoço, e, nos
intervalos das
refeições uma
ou outra mini também fresquinha. Continua,
contudo,
a não ser apreciador de cerveja. Sempre
gostou mais de vinho tinto. Também neste domínio não alinha com os
publicitários das marcas, nem das regiões demarcadas etc.. Quando
compra uma garrafa procura no rótulo se é vinho português e não
da UE. Depois
procura saber que castas lá estarão, dando preferência às castas
portuguesas, não alinhando com as novas castas estrangeiras
ultimamente plantadas nas
diversas
regiões vitivinícolas
do
país.
É um velho conservador em muitos aspetos. Um
velho que vai vivendo tresmalhado do rebanho, fazendo a sua caminhada
na outra margem na travessia do deserto humano onde não se enquadra
nem se revê.
Vive sozinho, consigo, com a sua amiga Sacha, com os seus fantasmas e
com a sua loucura silenciosa. Coloca fotos na rede social onde ainda
permanece. Olha os comentários na esperança de ver quem não
aparece.
Não
ouve notícias na rádio. Tão pouco vê televisão nos seus
aparelhos. Só lê as primeiras páginas dos jornais no seu pequeno
aparelho de comunicação.
Sente
falta de um jornal em papel, não no ecrã do computador ou do
aparelho de comunicação. Contudo ao olhar para a oferta à sua
disposição não vê nenhum que sendo crítico seja isento nas suas
análises. Claro que ainda há bons jornalistas, mas ou escrevem
pouco por decisões superiores ou são colocados em áreas menores do
próprio jornal.
Assim,
neste tempo de pandemias e guerras, refugia-se na música e na
leitura de livros e de alguns poucos blogs.
Olha
a guerra pelo pouco que ouve na rádio e redes sociais. Não precisa
de mais. Canais televisivos RTP1, SIC e TVI na sua televisão TDT não
são sintonizados por sua livre e espontânea vontade. Mesmo a RTP2 e
RTP3 só o são até à primeira imagem ou palavra que se refira à
guerra na Ucrânia, automaticamente a sua mão alcança o comando e
desliga o aparelho, não muda de canal. O mesmo se passa com os
canais espanhóis que sintoniza.
As
notícias de "apsico" dos vários intervenientes ativos e
passivos, raramente são verdadeiras sobre o que se passa no terreno.
Depois, se a guerra é em si mesma o expoente máximo da crueldade
humana em confronto, relatar em direto essa mesma crueldade não é
um bom serviço à tão desejada Paz.
A
guerra é a guerra. É a guerra a consequência da incapacidade dos
dirigentes políticos levada às últimas consequências. Eles, os
dirigentes, não vão à guerra, mas mandam matar.
A
guerra é a guerra e nela não há convenções disto e daquilo.
Podem os crentes levar a Bíblia mas não levam códigos de leis
porque só há um código na guerra que é guerra, ou se mata ou se
morre, restando as ténues hipóteses alternativas da rendição ou
de ficar ferido deficiente. A guerra é a crueldade posta em prática,
valendo tudo, incluindo tirar os olhos a frio. As convenções
existem para os que não vão à guerra mas mandam os outros matar,
assim como, para os que sentados, burguesmente, nos seus sofás e
cadeiras comentam a guerra como se de um filme se tratasse, sem
conhecerem o que é a guerra que é guerra.
Nos
tempos que correm os que se guerreiam em terras da Ucrânia nunca
serão vencedores tantas são as vidas que se perdem, tantos são os
infelizes que dela resultam.
Tomar
partido por um dos líderes em confronto naquela guerra a três, não
toma. Nenhum deles no seu pensar, é flor que se cheire para o seu
olfato. Nenhum presta. E quando não prestam o melhor é não tomar o
partido de um ou do outro.
Sofrem
terrivelmente as populações ucranianas e russófonas que lá vivem.
Sofrem eles e em menor escala sofremos todos nós, povo europeu que
nem sequer fomos ouvidos.
Quem
conheceu a guerra, quem um dia ouviu o cantar das balas inimigas…
não dá ouvidos aos charlatães que hora a hora difundem a versão
oficial emanada pelos lacaios da OTAN/NATO, nem tão pouco partilha
as notícias que chegam do outro lado. Aguarda criticamente a tão
desejada Paz. Mesmo quando esta chegar um dia continuarão os crentes
da OTAN a venerar o pensamento único ocidental como o melhor modelo
de democracia. Já assim o fizeram na falsa "Primavera Árabe"
com os resultados que infelizmente se conhecem.
Sim,
há notícias do outro lado vindas de órgãos de comunicação com
tanta credibilidade como os ocidentais que nos entram pela casa
adentro, porque o Planeta não é felizmente apenas e só a UE com os
seus vesgos censores e submissos dirigentes sem coluna vertebral.
Felizmente
no Planeta ainda há luar. A Esperança renasce a cada dia, trazendo
com ela o sonho da Paz entre todos os povos com os seus seres
humanos, todos diferentes, todos iguais.
Como um dia escreveu B.B. «as novas antenas continuam a difundir velhas asneiras».
Quase tudo igual aos dias que passaram.
Sentado
na sanita com o aparelho de comunicação na mão, os óculos postos,
olhou as capas dos jornais generalistas e desportivos. Tirando a capa
do Público com a foto da retirada dos feridos na siderurgia
ucraniana, que tanta tinta tem feito correr, nada mais lhe chamou a
atenção.
Há também artigos sobre a nossa história à volta dos
agora falados "Metadados". Como nunca leu a lei ou o
decreto-lei que está na origem da declaração de
inconstitucionalidade pelo Tribunal Constitucional, e, como pouco ou
nada sabe sobre o tema, cala-se e aguarda serenamente o que se irá
seguir com o assunto que parece ir fazer correr muita tinta.
Há
muito que na sua opinião, o Tribunal Constitucional deveria ser uma
secção do Supremo Tribunal de Justiça e não um tribunal onde haja
membros indicados pelos partidos políticos com acento na Assembleia
da Republica.
Da
Justiça e do Ministério Público o melhor mesmo é nunca se cruzar
com tais personalidades, já que seguem o exemplo do Estado político
que se consolidou após 25 de Novembro, isto é, «fraca(o) com
os poderosos, mas forte com os fracos». Daí, o melhor é evitar
problemas com essa gente, que tem conceitos bastante diferentes do
que deveria ser, na sua opinião, a Justiça Democrática é o
próprio Estado Democrático.
Nova
semana com as mesmas rotinas, as mesmas dúvidas sobre o presente,
num Planeta em que parte dos humanos parece não ter futuro, tão
incerta vai a vida.
O
tempo, essa constante imutável, passa no seu inalterável movimento,
sem pressa, sem correrias loucas.
A
loucura não pertence ao tempo, é sim um fungo ou talvez antes um
vírus criado e fomentado pela sociedade humana.
Muitos
são os interesses humanos que a utilizam e dela se servem em
benefício próprio ou quando muito de um grupo restrito de amigos
com os mesmos interesses.
A
sua loucura silenciosa é inofensiva, acompanhando-o há já algum
tempo. Mostra-se presente todos os dias, a qualquer momento. Foi-se
habituando a viver com ela, considerando-a já, como sua companhia.
Lá
longe na cidade grande, mas não assim tão longe, há outras
loucuras de estirpes bem mais perigosas e virulentas para o futuro. A
política ideológica, como filosofia de modo de vida, deixou de ser
diferenciadora entre os que vão exercendo cargos governativos.
Poucas são as exceções, raras mesmo as diferenças significativas
entre os que entram e os anteriores que governaram. Todos ao centro
alinham pela média sem variância nem desvio padrão. A diferença
está na forma como nos enrolam, uns usam vaselina e cremes que nos
dizem ser biológicos, enquanto que os outros não, preferindo o
natural a frio sem anestesia. Todos eles obedecem, sem saber crítico,
aos liberais, mais ou menos "neo", que nos comandam desde
Bruxelas, sem que tenhamos tido a oportunidade de escolher essa gente
executiva que domina os corredores cinzentões de Bruxelas decidindo
sobre a nossa própria vida.
Escolhemos
parlamentares para a decadente U.E., para que se entretenham a
conversar, a dialogar, a discutirem e a viajarem muito em múltiplos
grupos criados enquanto por lá estão, numa vida despreocupada muito
bem remunerada e recompensada. Pouco ou nada contam esses deputados
eleitos para o controle do exercício das políticas concretas
europeias.
Da
guerra que ocorre lá longe, mas não assim tão longe, vive cansado.
Na verdade, nunca gostou de ação psicológica. Ação essa que não
passa de uma falsa forma dos senhores da guerra promoverem o ódio e
a morte entre os seres humanos mais incautos, distraídos e velhacos.
Dia
a dia mais longe do rebanho defensor do pensamento único vigente
ditado pela "apsico" ocidental.
Dia
a dia mais tresmalhado dos que não alinham com o pensamento único,
usando em alternativa outras formas de "apsico".
Com
o passar do tempo, a sua loucura silenciosa mantém-se evoluindo
lentamente, fazendo-se sua companhia, dia após dia que vai somando
sem pressa. Caminham os dois lado a lado nos trilhos e veredas que a
vida lhe vai proporcionando.
Por ali
o mundo continua colorido de múltiplas cores. Caminha sempre
acompanhado por lembranças que dançam ao som das várias músicas
que a mãe Natureza oferece graciosamente livres de impostos e taxas
diretas. Igualmente livre dos sabichões que tudo comentam com exímia
sabedoria mesmo quando nem sabem do que estão afinal a falar, assim
como daqueles que se fazem passar pelo que não são.
Por
ali nada é a preto e branco e tudo tem a liberdade de nascer, viver
e morrer nos seus ciclos de vida que há muitos e muitos anos se
repete anualmente, desempenhando a sua tarefa existencial, quantas
vezes desconhecida do viajante que por aqueles caminhos anda em busca
de paz, fora dos roteiros turísticos do mundo consumista sem freio.
Foi
à procura do renascer do Sol, que sempre há muitos séculos chega
do lado da Extremadura espanhola. Mas o céu carregado de nuvens
ameaçando a trovoada anunciada no seu pequeno aparelho de
comunicação encobriu o deus Sol. Não ouviu trovões nem viu
relâmpagos, mas sentiu o corpo molhado pelos pingos da chuva grossos
que desceram das nuvens. Sentiu-se jovem quando a água da chuva
escorria pelas faces. Há quanto tempo não sentia a chuva
escorrer-lhe pela face.
A
vida tem sempre algo de belo, mesmo quando os que mandam nas coisas
da guerra e seus vassalos súbditos sem coluna vertebral nos querem
parametrizar os neurónios de modo a que volte a dominar com todo o
vigor, o pensamento único difundido vinte e quatro horas sobre vinte
e quatro, numa paisagem única a preto e branco, vai tresmalhado do
rebanho caminhando escutando a sinfonia livre das aves que saudavam o
renascer de mais um dia . Por aqueles caminhos e quelhas não há
bons nem maus, tudo e todos pertencem sem exclusão à mãe Natureza
que anda triste com a ação do seu elemento Homo Sapiens.
Não
foram dias fáceis os que passaram. São lembranças de momentos
tristes que marcaram a sua vida.
No dia doze, fez anos que o seu pai
foi encontrado no chão do quarto meio inconsciente, não o
reconhecendo quando alertado pelo pessoal do lar correu para junto dele, e, nunca mais se
recuperou no mês e quatro dias em que esteve internado no hospital.
No dia treze, fez anos que a sua mãe ao levantar-se de manhã da
cama caiu vítima de um AVC que a deixou imobilizada do lado direito.
Há muitos anos, era ainda uma criança, ao fincarem os dois irmãos
em casa enquanto a mãe foi à mercearia da vizinha, ele fez com que
a panela que tinha água a ferver no fogareiro a petróleo caísse e
queimasse o seu irmão que ficou com as marcas para sempre no corpo.
Maio
para muitos o mês das rosas é nas suas lembranças um mês de
espinhos mais do que pétalas.
Para
onde vamos? Que caminhos serão esses…? A eterna incógnita que o
acompanha. De nada vale ter medo do futuro. Sofrer por antecipação,
não é saudável, conhecendo ele o sabor desses estados de espírito
procura afasta-los, agora que caminha pela reta que o levará à meta
final, de onde não haverá retorno, a água secará no seu corpo
reduzindo-o a pó, enquanto o espírito partirá para uma dimensão
desconhecida, que não está ao alcance dos nossos sentidos. Há que
viver em harmonia consigo mesmo, com os outros que o rodeiam, embora
desconhecendo e ignorando os seus sonhos, e, por fim, viver em
harmonia com a natureza. Tudo parece tão fácil, tão harmonioso e
belo. Contudo, outros valores, outros interesses existem
sobrepondo-se, tornando o que deveria ser belo num mundo de nuvens
carregadas de ódios e poderes radioativos, que lentamente infernizam
a vida em sociedade. Vendem-lhe que o ser humano é um ser sociável,
para no mesmo momento pregarem aos sete ventos, as maravilhas do seu
eu individualista. O indivíduo, dizem-lhe é a célula base da
sociedade em que o importante é essa mesma individualidade. Não
gosta desse modo de pensar e viver. Não alinha nessa filosofia do
pensamento liberal. Para ele o bem do coletivo deverá sobrepor-se ao
bem individual, porque o coletivo não elimina o individual, já o
individual não eliminando o coletivo simplesmente ignora-o.
Preparou-se
e dirigiu-se ao Centro de Saúde. Já há mais de dois anos que não
lhe marcavam consulta médica. Neste tempo de intervalo até mudou de
médica de família. De uma Susana passou para uma Juliana que iria
conhecer.
Ia
com receio pois não tinha nenhum documento físico que comprovasse a
marcação. Inicialmente por e-mail marcaram-lhe consulta para Julho,
sendo que posteriormente lhe telefonaram alterando a consulta para a
manhã de hoje. Entregou o cartão de cidadão à funcionária da
segurança que o introduziu numa máquina e à segunda tentativa lá
saiu o papelinho da confirmação da consulta. Subiu ao primeiro
andar e aguardou na sala onde todos os utentes usavam a respetiva
máscara. O ecrã dos números era falante pelo que não tinha que
estar a olhar, bastava ter a audição atenta à máquina falante de
voz autoritária.
Para
a sala entrou depois dele uma senhora muçulmana ou casada com
muçulmano, já que mesmo sem burka só se viam os olhos. No SNS
todos somos utentes e iguais. Como sempre, alguém mais velho tentou
furar a ordem estabelecida nas senhas distribuídas pela funcionária
da segurança. É o eterno chico-espertismo dos portugueses. Cansado
aguarda que o chamem. As 11H do telefonema passaram para as 11H20 da
senha de confirmação da consulta. São 11H47 e a maquina falante
continua sem chamar o seu número. Ele que chegou às 10H40, os tais
vinte minutos antes, que antes da pandemia do sars-cov2 ou do estados
de emergência lhe pediam para chegar antes da hora marcada. Não
sabe se é da pandemia se dos Estados de emergência decretados .
Finalmente lá o chamaram.
Caminha
sozinho na reta final que o levará ao fim desta sua experiência
terrena. Sem medo do momento final, desejando viver mais uns anos a
fim de não deixar "rabos de palha" quando a água secar no
seu corpo. Caminha, carregando em silêncio tudo o que fez e não
fez. É a vida. À medida que percorre a reta final e o tempo foge, o
caminhar vai ficando mais pesado.
Olha
o que se passa nos ecrãs das televisões quando se senta a comer.
Olha, mas não vê nem ouve. Tudo para ele são encenações. Nunca
como agora, desde a segunda metade do século passado, que a ação
psicológica do pensamento único ( a designada “psico” do seu
tempo de guerra), de um lado e do outro da guerra, esteve tão
avançada, tão agressiva no parametrizar das mentes dos crentes, e, dos que têm dúvidas, dividindo-as entre os bons e os maus consoante
o lado em que se encontram. Querem o Mundo a preto e branco. Querem
que se ignorem todas as outras cores. Tudo para ele cheira a mentira
putrefacta. Ao anti judaísmo primário reinante em especial dos
séculos dezasseis e dezassete, reina agora no final do primeiro
quartil do século vinte e um, o anti russo, o anticomunismo primário, confundindo o povo russo com o comunismo. Para a maioria
do rebanho ocidental pouco interessa que os atuais líderes russos,
promotores da invasão do país vizinho, sejam fervorosos adeptos do
capitalismo neoliberal, produtor de oligarcas a exemplo do que passa
no outro lado do Atlântico com os líderes republicanos e
democratas, representantes dignos dos oligarcas americanos, que os
elegem para que exerçam o domínio sobre outros povos e nações.
É
o domínio económico que uns e outros disputam em terra de
terceiros. Guerra de oligarcas onde o sofredor, é como sempre o povo
anónimo, e, dentro deste as crianças, depois os velhos e as
mulheres, sendo que a atual ação psicológica está também a
utilizar os animais domésticos nas suas imagens emocionais da "psico" metralhada dia a dia, hora a hora. Tudo serve aos vendilhões.