Era
quarta-feira véspera de uma "ponte" de feriados na cidade
de Lisboa. Por uma conjugação de feriados, com o 9 de Junho Corpo
de Deus, o 10 de Junho Dia de Portugal, a antecederem o fim de
semana, e, o 13 de Junho Santo António feriado em Lisboa a proceder o
mesmo.
Os
funcionários do Estado, incluindo médicos obstetras, enfermeiros e
muitos trabalhadores, só voltariam ao trabalho na próxima
terça-feira, dia 14 de Junho. Foi por isso, aquela quarta-feira, 8
de Junho de 1977, o dia "D" para o jovem casal.
Naquele
tempo, a tecnologia ao serviço da saúde, não permitia saber o
desenvolvimento do feto, apenas, recorrendo ao milenar saber da
classe médica, calculavam o momento previsível do nascimento.
No
dia anterior, o jovem casal foi à Maternidade Alfredo da Costa, onde
a futura jovem mãe ficou internada. Segundo o parecer médico que
acompanhou a gravidez, o tempo para o bebé nascer tinha terminado e
iam forçar o seu nascimento.
Naquele
tempo, nos hospitais públicos, não era normal o pai assistir ao
nascimento. Embora o pudesse ter feito, pois havia a tia Umilta que
lá trabalhava. Ele não quis assistir ao parto.
Depois
de ter deixado a sua companheira internada foi trabalhar.
Voltou
cedo para casa, aguardando que o telefone fixo tocasse para informar
do nascimento, e, se era menina ou menino. Não existia ainda a
tecnologia dos telefones de bolso ou telemóveis.
Sem
notícias da Maternidade, no final da tarde, foi com o amigo Necas
festejar o dia de aniversário deste, jantando os dois na Cervejaria
Trindade em Lisboa. Já a noite ia alta quando regressaram a casa. Se
bem comidos, melhor bebidos, mas conscientes. O amigo dormiu na sua
casa. Logo de manhã, ele, levantou-se, tomou banho, deu à ignição
do seu "Fiat 127" e foi para a Maternidade em busca de
notícias. Não havia notícias. A jovem mãe não fazia dilatação
aguardando o parecer da visita do médico da manhã. Por lá ficou
aguardando com ansiedade. O tempo andava no seu modo constante,
porém, a ausência de notícias era também uma constante. Por volta
do meio-dia chamaram-no ao corredor. Lá vinha a tia como uma
enfermeira que muito felizes lhe mostravam que era pai de uma menina.
Bem quis olhar a carinha do seu bebé, mas elas só lhe mostravam o
sexo dizendo que era menina e que a mãe estava a recuperar no
recobro pois tinha sido um parto por cesariana.
Quando
a levaram para dentro, ele antes de se meter no carro, telefonou de
uma cabine pública, aos pais para os informar do nascimento de mais
uma neta Catarina. Pouco tempo antes, a 29 de Abril, o seu irmão em
Coimbra, também tinha sido pai de uma menina, a Inês.
Meteu-se
no carro e foi almoçar a casa dos pais aos Olivais. Os pais todos
felizes logo se prepararam para ir ver a nova neta na visita da
tarde. Ele ficou a descansar. Só voltaria lá, na visita das sete da
tarde, para estando só, poder olhar a sua linda menina e procurar
saber do estado de saúde da sua companheira e mãe daquela
preciosidade.
Sabia
que os seus pais desejavam ter netas pois só lhes nasceram rapazes.
Ele sendo o mais novo dos dois rapazes foi desejado menina, mas
nasceu menino.
Descansando
sozinho na tarde daquele dia, recordou a segunda vez em que veio da
guerra em gozo das merecidas férias. Estando em trânsito da guerra
do Leste de Angola para a casa de seus pais nos Olivais em Lisboa, ao
sair do Hotel Kate Kero, no Largo Serpa Pinto em Luanda, olhou o céu
azul e disse para a sua sombra, - se um dia vier a ter uma filha, o
nome dela será Catarina.
Ainda
nem namorava, mas aquela data sempre o tocou pela simbologia que
tinha na luta pela Liberdade, contra o sistema de ditadura
fascisante, a que os portugueses tinham estado submetidos. Foi no dia
19 de Maio de 1974 que gravou na sua memória o seu desejo. A 8 de
Junho de 1977 pode concretizá-lo já em Liberdade.
Tinha
o jovem casal decidido, que se fosse menino era a mãe que escolhia o
nome, se fosse menina era ele que escolhia o nome. Nome que ele
guardava desde aquela tarde na cidade de Luanda. Ainda tentaram que
não fosse apenas e só Catarina, mas a todas as solicitações, fez
ouvidos moucos. A sua menina iria chamar-se Catarina Pernes Andrade.
Uma
história de vida que hoje celebra os seus quarenta e cinco anos, com foto de uns anos bem atrás.