sábado, 29 de outubro de 2022

25 de Abril de 1991 - Gazeta do Interior

Numa entrevista efetuada por dois jornalista a Salgueiro Maia e Otelo Saraiva de Carvalho, pode-se ler:

"Maia: Quem fez o 25 de Abril foram os homens da Guiné, onde nós próprios nos conhecemos. Depois das negociações do Spínola com o Sengor e o Marcelo Caetano ter respondido com «vitória ou morte, até ao último homem», a guerra para nós perdera qualquer sentido. E a ditadura cai porque acima de nós só havia Deus. O regime pega em nós, jovens com vinte e tal anos, e dá-nos responsabilidades que hoje os generais não assumem. Por isso é que nos era indiferente mais Marcelo, ou menos Marcelo. A segunda razão do sucesso é que tivemos a comunicação social connosco. "

Noutro momento da entrevista Salgueiro Maia diz:

" Cada vez que me pediam para falar nesta altura das comemorações, a Instituição Militar dizia que tinha de fazer um requerimento. Até que, já farto, me decidi a fazer um requerimento para saber em que termos legais tinha que fazer um requerimento a pedir para falar. Até hoje. Claro que a partir daí limito-me a dizer, por consideração, que dei uma entrevista ao jornal tal e tal. A primeira entrevista que dei a sério foi ao Assis Pacheco, e aí fui mesmo chamado ao comando militar da região, porque alguns generais tinham reclamado que aquilo era uma provocação. É que eu dizia que quando tinha partido para a guerra, convencido de que ia defender a fé e o império, afinal concluiria que a fé era pouca, e o Império não existia, aquilo era de meia dúzia, por outro lado, o inimigo que eu tinha que combater eram indivíduos conscientes, em luta pela sua liberdade e independência, como nós já o fizemos em 1144 e 1640. Depois conto dois casos de quando comandei uma companhia de Comandos. De uma vez fizemos dois prisioneiros, e um é morto com uma facada à frente do outro, que é ameaçado de lhe acontecer o mesmo se não falar, e é ele que diz para o matarmos. De uma outra vez atingimos um gajo com um tiro nas costas e seguimo-lo, convencido que nos levava para o acampamento e ele foge em sentido contrário com as tripas nas mãos. Aqueles homens não podiam estar errados. Claro que guardo comigo as ordens e os relatórios de operações onde se dizem coisas comprometedoras. Por isso, como esclareci na altura, não disse praticamente nada na entrevista"

E algumas outras coisas disseram os dois militares de Abril, naquele entrevista em 1991, cujas folhas do jornal Gazeta do Interior encontrei entre os papéis do meu pai.

Hoje já há várias obras que relatam os fatos ocorridos logo após a confirmação da vitória no 25 de Abril até à chamada normalização da vida democrática imposta pelo 25 de Novembro, onde o embaixador Carlucci tem sempre lugar pelas ligações estabelecidas com vista à implementação de um modelo de sociedade que agradasse aos E.U.A..

A pouco e pouco vão-se conhecendo fatos e nem todos serão abonatórios para algumas personagens da nossa política.

Para terminar e voltando às afirmações de Salgueiro Maia na referida entrevista, diz o mesmo: "Eu próprio, só não fui preso porque nunca me candidatei à Presidência da República. Porque se de alguma maneira me tivesse perfilado no horizonte como alternativa, arranjavam-me uma logo implicação qualquer para me levarem dentro" .

A vida é uma moeda muito mais complicada que aquilo com que nos enchem os ouvidos ou nos contam os vencedores, há sempre outras histórias na outra face da moeda.

(Foto da net)

 

Sem comentários:

Enviar um comentário

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.