quinta-feira, 2 de janeiro de 2025

01.08.24

 

Recomeça o tempo de um novo mês, o oitavo do calendário. Nada mudou, o céu continua encoberto, um pouco mais fresco até. É o tempo do oeste a norte ou a sul do Cabo Carvoeiro, sempre muito dependente dos humores do Anticiclone dos Açores, esse centro de alta pressão que vagueia normalmente no oceano Atlântico entre as ilhas dos Açores e o sul da Inglaterra.

A praia com mar de águas que ainda deixam ver os pés na areia quando se entra e se avança nele, de areia um pouco grossa para os novos visitantes, já não me chama, o estender a toalha para colocar o corpo ao sol já não é a minha praia. Só os netos me trazem para com eles e com a sua alegria inocente poder viver ou reviver tempos felizes do passado quando aqui cheguei com doze anos e mais tarde quando deixei as praias algarvias e para aqui retornei com as filhas. A maré está na praia-mar mas o vento norte não convida os veraneantes a irem ao banho.


Na areia os netos com os amigos jogam ao 31 entre barracas até que cansados de tanto correrem pediram e lá foram ao banho com o neto Guilherme a dizer-me que a água estava fria, habituado que está às águas algarvias e espanholas, mas se os outros foram ele venceu o frio e também deu um mergulho; a neta Luísa nunca tem frio é um peixe mergulhão. Assim se vive e revive momentos de felicidade.


Mudei, todos os dias mudo um pouco, sempre um pouco mais nesta reta final onde não entro nem saio pela porta que insiste em ficar aberta quando a empurro para a fechar, até quando não sei, mas um dia no incerto futuro quando a minha dualidade terminar ela se irá fechar sem necessidade de a empurrar.

Estou à beira mar olhando não o passado mas o meu canto onde a maresia e o odor do iodo libertado pela decomposição do limo correia que o mar entregou ao areal não chegam,

só, estou aqui e estou lá observando a passarada depenicando uvas e figos, sentindo nesta manhã de neblina fresca o odor seco da terra quente.


Não sei onde é que eu e a mãe erramos na educação das filhas. Olho a anarquia na casa, abro o frigorífico e assusto-me com a desordem no arrumo dos alimentos, não há caixas de conservação, subi aos quartos e fechei os olhos, nem sequer puxam as orelhas aos lençóis e ou edredões, com esta escola como será a vida das netas quando tiverem a sua casa?

De nada me vale ficar preocupado, já não digo nada, sou um velho sem velhice que já não tenho futuro neste país de vidas ilusórias, com uma juventude pouco inquieta e reivindicativa politicamente, uma juventude em que os pais ignoram o bufar dos falcões internos da OTAN preparando-se para no futuro com as várias guerras que os seus mandantes americanos promovem e desencadeiam, necessitarem de terem jovens disponíveis para servirem como «carne para canhão»; às gerações pós 25 de Abril só lhes interessa festivais de música e viagens de turismo para fora do país; a roupa tem de ser de marca sonante da moda que depois é atirada para cima de sofás e cadeiras ou mesmo no chão a monte, telemóvel tem de ser de marca e se possível última geração para que possam aer substituídos por novos modelos. A política não lhes interessa, dizem eles.

Que futuro terá o meu país?


Estou pela primeira vez com os netos mais novos que já têm nove anos, uma felicidade serena que já me tinha esquecido que existia.

27.7.24

 

Vi um pouco da abertura dos jogos olímpicos que de espírito olímpico já nada incorporam, mas é o que o poder nos serve para entretenimento e ilusões.

Vi o Sena com as suas águas e voltei pensar o que pensava quando ia a Paris em trabalho.

Vi indiferente, sem saudade de Paris nem uma ponta de nostalgia, apenas curioso, procurando ver sempre a outra margem. Tudo muda, tudo cambia, pensando que não sendo a lei da vida, porque a vida não tem leis, é antes o fruto de um modelo de desenvolvimento onde os interesses gananciosos se sobrepõem aos valores que estiveram na origem dos jogos olímpicos.

Da mentira tornada verdade salvam-se os atletas, que treinam e se sacrificam ao longo de anos sonhando poder alcançar um lugar honroso nas provas que irão disputar.

Estes são os jogos olímpicos do medo e da tecnologia, do estrebuchar de um país que parece ter esquecido o seu papel europeu de solidariedade, igualdade e fraternidade, vergado por políticos submissos ao neoliberalismo da City imposto do outro lado do Atlântico.

Só as águas do Sena se mantém como há vinte e trinta anos as via duvidando.


Não sou já daqui, sou de algures sem outro interesse que não seja viver em paz comigo próprio. Desenquadrado, tresmalhado deste modelo artificial de vida pouco me importo desde que continue lúcido com os meus cinco sentidos a funcionarem sem pílulas químicas.

Olho e vejo coisas que me revoltam pela falta de coragem dos políticos, pela incúria com que gastam dinheiros públicos sem que esse gasto traga mais valias para todos e não apenas para empreiteiros, consultores e financeiros. Os dinheiros que se gastam em enormes cartazes anunciando publicitando obras quantas vezes já anunciadas em anos anteriores, antes com a comparticipação de fundos bruxelianos, para agora neste tempo serem os fundos do tal PRR a financiarem parte dessas grandes obras autárquicas; obras que são sujeitas a estudos e mais pareceres de gabinetes públicos e privados assim como de organismos vários para justificarem no paleio a descarbonização do ambiente; obras que são apresentadas à votação dos vereadores para depois se ajustarem num caderno de encargos ao jeito das empresas amigas do poder não vá o diabo tecê-las no concurso público exigido por lei e pelo visto do Tribunal de Contas (que sem um quadro de pessoal à altura das necessidades ainda mesmo assim vai incomodando muitos autarcas). Realizada a obra com ou sem revisão de preços, colocam-se placas comemorativas em honra do autarca chefe com vivas e vivas entre abraços e lembranças dos pedidos para mais um empregozinho para mais um familiar amigo do partido. No final de tudo realizado, celebrações terminadas, fazem-se as contas na busca de soluções alternativas para a apresentação das mesmas às instâncias superiores confiando no conhecimento político e partidário existente nos corredores do poder por nomeação do chefe maior. Tudo sempre “A Bem da Nação” em versão democrática, sendo a manutenção e ou conservação de tais obras colocadas no esquecimento ou mesmo abandonadas por posteriores executivos pois o que importa é apresentar obra nova de modo a agradar ao chefe do partido na esperança de uma promoção ou até mesmo de uma boa colocação em qualquer dos muitos organismos públicos onde se ganham boas mordomias nunca deixando de sonhar com Bruxelas pois claro.

11.07.24

 

Acordo ao fim de seis horas de sono sentido o vazio da vida que transporto levanto-me. Há um vazio no meu peito que lentamente aumenta e me afasta dos mundos que gravitam à minha volta. Ontem à noite depois de ver mais um jogo da semifinal li que “o destino entra pela porta que nós mesmo abrimos convidando-o a passar” e no vazio penso nela, talvez seja verdade, talvez exista uma grande dose de verdade naquelas palavras, o destino somos nós que mesmo sem sabermos o construímos abrindo-lhe as portas.

Neste vazio por onde caminho abro o pensamento à dúvida se a minha constante afirmação de que sou um solitário não é uma forma de esconder a solidão que habita em mim há muito tempo. A minha caminhada tem sido um acumular de dúvidas e incertezas, de equívocos e enganos, por isso onde termina a solidão e começa o ser solitário?


Nasci no oitavo bairro administrativo da cidade capital numa rua rodeada de fábricas industriais.

Rumei aos oito anos a Peniche - Ferrel - Baleal, onde perdi o medo ao mar, onde fiz a escola primária e o exame de aptidão à escola industrial e comercial.

A fazer doze anos rumei a Peniche - Lugar da Estrada - Consolação, onde cresci, aprendi a conhecer o mar com o velho banheiro, grande Homem do mar e da terra, o sr. António Pedro e não mais voltei aos mares do Baleal; aprendi a gostar e a respeitar as ondas grandes do mar da Consolação, mar diferente de muitos outros mares.

Nas andanças da vida voltei à cidade que me viu nascer para continuar os estudos; como militar conheci a guerra no Leste de Angola e quando voltei para o colo de minha mãe já não era o mesmo que numa noite de quase inverno tinha partido sem dela me despedir; nunca me despedi das pessoas que amei. Casei, fui pai, dei educação às minhas filhas para elas poderem voar com as suas asas. Conheci a travessia do deserto do desemprego, do viver sem trabalho, sem dinheiro, sem seguro ou pensão de reforma. Resisti porque desistir é palavra proibida que deveria ser apagada dos dicionários.

Há uns anos tresmalhei-me, passei-me para o outro lado da vida, descrente dos políticos sem coluna vertebral que nos governam a mando de terceiros no exterior; passei a ver o que não nos mostram, passei a ouvir o que não nos dizem e tresmalhado vou caminhando em busca da paz.

Aos setenta e três anos olho na Consolação, o mar onde já não encontro as suas ninfas, já não me revejo com o seu deus e as suas falas; do alto onde antes havia um banco de cimento olho o mar que ano após ano vai encurtando a profundidade do areal e neste nos olharmos silencioso sabendo ele e eu que já não sou mais dali, mudei-me para outra terra onde os odores da maresia não chegam mesmo em dias de forte ventania por desavenças entre o Anticiclone dos Açores ao largo no Atlântico e o centro de baixas pressões no sul espanhol da Península. A vida é um círculo feito de muitos trilhos e veredas andando eu agora por outros horizontes onde o azul do mar é substituído pelo verde da copa das oliveiras e azinheiras, pelo dourado de muitos campos abandonados.

Tresmalhei-me até do mar da praia que me viu chegar quando eu tinha quase doze anos.

Velho sem velhice gosto agora mais da serenidade que a vida nos oferece no interior abandonado e esquecido dos muitos poderes deste país que a Natureza criou à beira mar e a ganância humana vem destruindo.


29.06,24

 

Sentado à mesa procuro ordenar ideias. A manhã apresenta-se de céu compacto, cinzento e húmido sem vento.

Sem ver televisão nem dar atenção às notícias que a rádio pública difunde, vivo, continuando a não sentir necessidade de lhes dar tempo de atenção, já que para o patronato que os domina e controla só existe uma versão, a deles, o contraditório é coisa de gente com problemas psíquicos, gente subversiva e perigosa a soldo dos inimigos do ocidente Atlântico. Pelo que vejo nos jornais e na rede social que ainda frequento entretêm o pessoal com o que se irá passar nas eleições americanas que muitos consideram o país da liberdade incapazes que são em analisar que a tal dita liberdade não é mais do que um partido único com duas secções, uma designada de democrata e a outra de republicana, que de X em X anos apresentam ao mundo a respetiva farsa, já que quem manda de facto são seres sem alma designados como gestores dos interesses expansionista de um modelo liberal sem regulamentação que facilite a exploração do trabalho e da natureza pelo capital ambicioso e ganancioso que representam.


Ainda faltam uns dias para me ir embora e já sinto alguma tristeza por ir deixar não só os tomateiros, videiras, aipo, pimenteiros, curgete, árvores (laranjeira, oliveiras, figueira e tangerineira) mas também está pequena casa onde tenho os meus antepassados, um canto que sendo fisicamente pequeno é maior do que muitos palácios.

25.06.24

 


Comecei ainda mais cedo os meus trabalhos, primeiro com a rega dos tomateiros, cebolas, curgetes e aipo, saindo em seguida com a Sacha para a volta matinal. Tomado o pequeno almoço enchi a garrafa de água e fui voltar às batatas. Hoje como ontem lá fui “capando” algumas. Amanhã de manhã termino. Depois do banho tomado fiz o almoço, seguindo-se a merecida sesta que o corpo, dorido por não estar habituado a estes trabalhos, pedia. Só depois ao olhar o facebook tomei conhecimento da previsível libertação de Julian Assange, uma notícia boa por fim. Vive-se hoje num mundo dominado por verdades fabricadas pelo poder do dinheiro nas mãos dos imperialistas americanos. Assange, jornalista sem medo, desmascarou as atrocidades cometidas pelos falsos dirigentes americanos, por isso viveu anos ora em prisão numa embaixada que lhe deu asilo, ora na prisão dos “bifes” anglicanos súbditos maiores dos aliados americanos.

24.06.24

 

Há uma hora que saí do mundo dos sonhos. Depois de me cuidar, de fazer a cama e conversar com o sagrado sento-me à mesa que foi de meus avós. Olho o relógio que na parede em frente faz tic-tac e os ponteiros dizem-me que são as seis e meia. O Sol já passou a linha do horizonte à cerca de meia hora. É este um mundo de raízes invisíveis que me faz sentir bem, um mundo onde o cheiro da maresia do mar transportado nas asas do vento não chega, que aqui o calor é mais quente e seco de poucas humidades.

Sabes, não não sabes, mas o mar que fez parte da minha vida de juventude já não me chama, não me atrai como em tempos me atraía para nele deixar grande parte da carga de stress que a vida profissional criava; a minha vida agora é de pouco stress porque já não tenho pressa de chegar onde só existe a ostentação do individualismo, o meu sonho não passa por esse modo de vida afastando-se do mesmo à medida que o rio tempo passa por mim.

De modo próprio tresmalhei-me desse mundo, agravando de certo modo e por certo o meu viver solitário, mas fazendo-me degustar o bem do não stress na outra margem da vida, onde a busca da Paz e da harmonia é agora o caminho que procuro concretizar, para quando chegar o momento da paz absoluta deixar tudo no seu próprio lugar, tudo resolvido sem sombras.


No caminho que fizemos, quando regressávamos dei com os olhos em ramos de poejo que à sombra da parede aproveitando a humidade da valeta cresceram. Toquei-lhes e logo o seu aroma me encheu. Gosto do poejo selvagem. Não resisti e trouxe alguns pés para transplantar na esperança que os mesmos se reproduzam.

Esta é mais uma coisa, um bem para o espírito, que nem o mar nem as cidades me podem dar. Não há calma como a do campo.

Lá longe mas não assim tão longe como a grande maioria do rebanho grudado nos ecrãs poluídos das televisões pensa, há uma guerra que ameaça, que destrói vidas mais do que bens materiais, uma guerra entre vários povos que se tornaram inimigos pela soberba e ganância desmedida dos falcões imperialistas sem alma humana. Uma guerra com dois lados, senão ela não existia, dois lados e muitos intervenientes. Uma guerra que se vai agudizando desde 2014 e não apenas e só a partir de 2022 como os papagaios e catatuas sem penas contam e comentam nas televisões recitando a voz do dono que lhe paga chorudas remunerações. No início da guerra para uns, da operação especial para outros, chamaram-me de putinistas, mandaram-me ir para a Rússia. Eu que sou português de lés a lés, europeu do Sul, nunca me vendi aos americanos nem aos russos, no meu tempo de política ativa gritava e defendia- “nem nato, nem pacto de varsóvia, independência nacional” - assim continuei pela vida fora, ausente que sou da política partidária, andando na outra margem da vida, agora não um jovem antes um velho sem velhice que gosta de viver, de fazer o seu caminho em direção ao inexistente futuro onde um dia após o fim da dualidade que me constitui se separar, a matéria reduzida a cinzas, para então fazendo jus ao lés a lés parte delas ser entregue clandestinamente ao mar numa maré vazante num mar calmo e sereno e, a outra parte descansar aqui neste interior raiano à sombra da velha oliveira galega enquanto a casa e as oliveiras se mantiverem na família, porque no cemitério da terra há como reserva a campa da tia Maria do Carmo onde se encontram também os restos de meus pais.



De manhã comecei a apanha das batatas no meio da muita erva que entre elas cresceu. Sem pressa fui procurando não “capar” nenhuma infelizmente acertei quase sempre nas maiores. No final da manhã a camisa e as trusses estavam encharcadas com o suor. Mesmo depois do banho as minhas mãos ainda apresentam o odor das ervas mal cheirosas, as ditas farinheiras. O dia foi quente, 35° pelo que à tarde fui ver as mensagens e e-mail no computador. A Autoridade Tributária demorou uma semana para validar a minha declaração de rendimento, mas lá a aceitou; andam preocupados com os fracos e subservientes aos fortes e ricos.

15.06.24

 

Às cinco e trinta já o dia se anuncia pela janela do quarto.

Olho o dia de ontem procurando afastar-me das emoções mas não sou capaz, nós somos emoções e eu não fujo à regra. O dia começou mostrando-me que nem sempre se vive em comunhão, para ao chegar ao meu refúgio e sentir como sempre o peso da dureza do silêncio que me mostra o não retorno do passado mesmo quando apenas se busca um simples ato explicativo de um acontecimento que não deveria ter acontecido mas que por razões ocultas aconteceu.

É assim que neste renascer do dia sentado na minha cama olhando a vida pela janela mais uma vez o que meu pai me dizia volta a estar presente «se queres vir para cá tens de arranjar outra mulher» ao que lhe respondia que não ia arranjar outra mulher. Já não tenho apetência para essas coisas. O amor pelos outros secou, pelo menos é o que sinto, não será fácil aos setenta e três anos voltar a partilhar espaço físico quanto mais ideais e sonhos, coisas que não tem idade indiferentes que são ao rio do tempo que passa por nós na sua constante imutável; coisas que são tão importantes nesta idade onde a solidão agressiva e tóxica está presente a todas as horas em programação contínua difundida por canais televisivos na posse dos senhores sem alma para nos querem parametrizar os neurónios e com isso nos trazerem pela trela amestrados e obedientes.


Era um quarto para o meio dia dei à ignição e fui até Segura ao Festival das Migas. Encontrei gente conhecida.

As migas estavam boas, muita variedade com os concorrentes a aplicarem-se na confeção. Grupos de vizinhos espanhóis não faltavam.


Quando o grupo musical encarregue de animar o festival terminou a sua atuação, para dar lugar aos grupos seniores de cantares de Segura, da Zebreira e dos vizinhos espanhóis, subiram ao palco os políticos. A minha sombra lembrou-me que desde 25 de Outubro não vejo televisão, não ouvi um minuto das campanhas eleitorais para a nossa Assembleia e para o tal Parlamento Europeu, decidindo num impulso dar corda aos sapatos, com pena de assim não assistir aos grupos seniores com os seus cantares. O domingo foi um dia bom. Pena já não haver os peixinhos do Erges, mas havia uma boa miga com o poejo do rio Erges. Gostei de todas as migas e não conhecia as migas à espanhola da Junta de Zarza La Mayor que estava muito agradável até por ser fresca realçando o sabor do tomate e do pimento. Mas estavam todas a merecerem palmas. Na Beira Baixa raiana há sabores e saberes gastronómicos.

13.06.24

 


Andava na recruta em Mafra quando comecei a fumar. Numa sexta-feira ao sair do “Calhau” dirigi-me à tabacaria que ficava junto à paragem dos autocarros da Mafrense e comprei um SG Gigante.

Saí nessa única sexta feira por na semana anterior ter tirado nos testes nota superior a catorze. Ao terminarmos o almoço estavam publicadas as especialidades que nos atribuíram para a especialidade, ao ver o meu numero mecanográfico e o meu nome atribuído para a especialidade “031 Atirador” senti as lajes do convento tremerem debaixo dos pés, não queria acreditar mas era a realidade que me estava destinada. Foi essa a causa definitiva do começar a fumar. Ao chegar a casa informei a minha mãe de que fumava para ela não me deitar o tabaco no lixo. Comecei a fumar na esperança que o fumo do tabaco me agudizasse o problema da asma e com isso poder sonhar com uma outra especialidade que não aquela de atirador de infantaria. Ainda andei na consulta externa para fazer exames ao problema asmático, mas ao terminar o tempo da especialidade fomos colocados contra a parede, ou desistíamos da consulta externa ou chumbávamos e teríamos mais onze semanas no “Calhau”. Desisti da consulta externa não queria voltar ao convento e repetir de novo tudo o que tinha suportado. Foi assim que me mandaram posteriormente para o B.C.10 em Chaves.

Do SG gigante de Mafra passei já em Chaves ao SG ventil, depois ao SG filtro fixando-me por fim no Português Suave sem filtro. Em Angola depois de experimentar o tabaco sem filtro que o sistema nos facultava, que era demasiado forte, passei a fumar AC o mais parecido com o SG gigante, mas a minha mãe enviava-me pelo Movimento Nacional Feminino volumes de Português Suave sem filtro. Em bases táticas só acendia o primeiro seguindo-se vários em continuo.

Terminada a guerra continuei a fumar o Português Suave sempre sem filtro. Casei e em casa não fumava. Contudo no trabalho era cigarro após cigarro. Era difícil deixar de fumar porque no trabalho ao participar em reuniões em salas fechadas onde muitos fumavam acabava por fumar cigarros dos que estavam ao meu lado, o designado tabaco marca «se me dão». Depois em festas sempre me ofereciam um cigarro e acabava por aceitar. Levei anos nesta situação. Um médico de medicina do trabalho ao efetuar-me um exame viu o maço de tabaco sem filtro que levava, auscultou-me e disse-me «o senhor tem nicotina nos pulmões para cinquenta anos». Comecei a luta comigo próprio para deixar de fumar, mas não foi fácil. Aconteceu quando um dia depois de algum tempo sem comprar um maço, de certo modo envergonhado por fumar o tal «se me dão» decidi-me a comprar um maço de Português Suave com filtro que coloquei em cima da minha secretária. Todos os que nesse dia entraram no meu gabinete aproveitavam e tiravam um cigarro para fumarem. No final, era já noite quando ia a sair peguei no maço para fumar um cigarro e já estava vazio. Senti uma sensação estranha e desde esse momento que nunca mais fumei um cigarro. Já houve momentos em que pensei, se tivesse um cigarro… , mas resisti e nunca mais fumei e penso não voltar a fumar.

Agora com os meses que levo sem ver televisão já senti a sensação de pegar no comando para ligar o terrível aparelho, mas resisto e continuo sem lhes dar ouvidos com exceção a alguns jogos de futebol, sem som de preferência. Não me interessam o que noticiem ou comentem porque assim não me enervo, não lhes chamo mentirosos e outros nomes, arranjando problemas em casa quando estou em Alverca porque olhamos o mundo com olhos diferentes. Ainda no passado domingo eu votei pela Paz e ela votou pela continuação da guerra, toda esperançosa e convencida que o seu voto ia ganhar, não ganhou mas os que ganharam mesmo que por poucochinho são todos pela continuação da guerra contra os russos.

Pela janela do meu casulo olho triste como a quase totalidade do rebanho que foi votar optou pela continuação e agravamento da guerra sem nunca terem sentido como as guerras são horríveis de tão más pois já não há guerras santas. Isto sou eu que ao não ver televisão não ouvi nem li nada do que cada uma das organizações políticas concorrentes disseram antes e após a eleição. Se imaginassem o que é sofrer o medo de morrer ou de ver um companheiro morrer sem lhe poder valer… mas intoxicados e alienados pelos programas televisivos de sentido único, desconhecem o horror que a porcaria da guerra cria. A designada guerra do ultramar foi uma brincadeira comparada com as guerras que ocorrem na Ucrânia e na Palestina. Votaram não se lembrando que os filhos e os netos ainda podem ser enviados para a guerra como carne para canhão, depois irão chorar de arrependimento se as armas nucleares não chegarem a ser usadas, pois se a guerra entrar nessa face poucos cá irão ficar para relatarem o sofrimento antes e após e deflagração das mesmas.

É assim que vou sentindo vontade de lhe voltar a escrever, mas a exemplo do fumar e do não ver televisão recuo. Nem sempre o consigo fazer.

13.06.24

 

https://www.cmjornal.pt/tv-media/detalhe/grupo-impresa-com-passivo-financeiro-de-212-milhoes-de-euros

Para os aldrabões amigos do poder financeiro não falta dinheiro para continuarem a difundir as asneiras que a «voz do dono» lhe ordena.

11.06.24

 

O dia das eleições já passou. Segue-se-lhe um outro dia em que a hipocrisia sai à rua em festejos oficiais. Às vezes penso no que escreveria o poeta desta corte republicana que se passeia pelos corredores dos palácios. Pelo certo também o iriam desprezar talvez mesmo o prendessem nas novas masmorras a exemplo do que lhe terão presumivelmente feito os jesuítas inquisidores daquela época.

Coitado do Luís, que dele se servem os descendentes dos que o ostracizaram e deportaram para marés e terras distantes, valendo-lhe a amizade de fidalgos amigos que o trouxeram de novo à terra mãe para mais tarde o livrarem da fogueira a ele e ao original da sua obra.

Presumivelmente estas possíveis verdades incomodando a nova nobreza reinante dita democrática e republicana em união de facto com a ortodoxia religiosa impedem que se célebre com honra os quinhentos anos do seu nascimento.

Quanto ao que se passou no dia anterior, ou seja, da votação sem anteriormente ouvir um segundo o que uns e outros disseram, também não ouvi nada pós resultados; que terão dito os chefes e os cabeças de listas já nada me incomoda porque todos na verdade ganharam apenas o país duvido que tenha ganho. Cumpri o meu dever de cidadão. Feliz também por minhas filhas terem cumprido com o delas, votando. Eu pertenço à minoria que votou pela PAZ na Europa de Lisboa aos Urais, é essa a minha Europa e não a organização de Estados Europeus submissos e lacaios dos imperialistas americanos amantes de guerras e genocídios.

Aos que me irão acusar de putinista ou mesmo comunista digo já que sou demasiado pequeno-burguês para ser comunista, sou republicano mais à esquerda e não ao centro, português europeu do sul, respeitando crenças religiosas e costumes; sou tão anti Putin como anti americano, contudo, compreendo e respeito a intervenção militar da Rússia na Ucrânia como forma de defender as populações russas que viviam no Donetsk e Lugansk na região de Donbass dos constantes ataques com que os nazis ucranianos as vinham martirizando desde 2014, ano em que os imperialistas americanos promoveram o golpe de estado na Ucrânia colocando no poder homens de sua confiança reféns dos vários grupos nazis existentes e fomentados pelo designado ocidente democrático.