quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

22.01.17

Habituou-se a levantar-se cedo. Raros são os dias em que dorme oito horas seguidas. Cinco ou seis horas seguidas são suficientes. Agora até usa um relógio no pulso que o informa do número de horas dormidas em sono profundo e em sono leve. A tecnologia ao serviço da informação. Depois, bem depois do almoço, seja verão ou inverno sabe-lhe bem uma pequena sesta. Sua mãe dizia que o filho tinha sono de gato. Quantas vezes no trabalho depois de almoço se sentava na casa de banho para uma sesta rápida fora de olhares indiscretos. É assim que acorda às cinco da manhã sem vontade de voltar a dormir. Neste mês de Janeiro, neste interior profundo e há muito abandonado à sua sorte, depois de se lavar decide sentar-se na cama para ler ou escrever. Na casa de banho já olhou as capas dos jornais, já olhou a rede dita social onde ainda permanece. Agora, sentado e agasalhado na cama que herdou dos seus avós e sempre o acompanhou, ouve o silêncio e pensa na vida, desembrulha memórias há muito guardadas, para voltar a embrulhá-las e arquivá-las de novo na gaveta de onde as retirou. De nada lhe serve pensar no que fez, no que deveria ter feito, no que teria sido se tivesse feito escolhas diferentes. O passado é passado, uma escola onde não se pode voltar atrás, onde as repetições estão ausentes por impossibilidade que não se discute, aceita-se e nada mais se pode do que trazê-la à memória ativa, para recordar o que fez; lembrar o que não deveria ter feito é perda de tempo e às vezes puro masoquismo. Na vida só há um sentido, seguir em frente até que a água seca no nosso corpo que o espírito já se foi para uma dimensão desconhecida dos nossos sentidos.

Gosta de ouvir as falas do silêncio. Assim como um dia na sua juventude o velho banheiro lhes ensinou a olhar o mar escutando o estado de espírito do deus Neptuno, também o silêncio tem suas falas que dependem muito do estado de espírito de Éolo, o deus do vento.

A sua amiga Sacha já quis ir lá para fora ver como acaba a luz noturna e começa a diurna. Tudo nesta manhã de segunda-feira é silêncio, calmo e sereno a aconselhar reflexão, embora já saiba quais as tarefas que terá de fazer neste dia no seu pequeno quintal. Irá podar as videiras. É a primeira vez que irá executar este trabalho. Depois preparar a terra para umas batatas. Manias que mantém porque sempre disse ao seu pai que não iria abandonar quer a casa quer o chão onde algumas oliveiras resistem à pobreza do terreno. De tal modo leva esse desígnio que daquele chão de oliveiras já leva um outro que foi do seu tio avô João Capelo e presta-se para ficar com um outro chão de oliveiras de seu primo e padrinho. E entre as ondas do silêncio pensa no que o seu pai diria se ainda por cá andasse. Ele que o conhecia melhor que ninguém ficaria admirado mas orgulhoso de certo. A vida é um mar de muitas ilusões e de muitas surpresas daí o podermos dizer que entre o bom e o menos bom tudo somado, a vida é bela. 

 

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