sábado, 10 de novembro de 2018

Eram jovens


0711
Eram jovens saídos da puberdade. Andavam na mesma escola secundária, desde sempre na mesma turma, que por coincidência era mista nas aulas, com recreios separados por um muro real e imaginário que uns e outros não podiam pisar nem ultrapassar.
Ele olhava para fora da turma, gostava de uma moça lá da sua aldeia. Mas ele sabia que ela, a sua colega desde o primeiro ano, gostava dele naquele último ano em que estudaram juntos naquela escola. Ela era uma excelente aluna, sempre com notas altas, já ele era um bom aluno com as notas suficientes para passar os anos sem sobressaltos de maior.
Chegados ao quinto ano de então, duas alternativas havia, ou começavam a trabalhar, que naquele tempo não se conhecia esta coisa de “desemprego” nem de “subsídios”, ou continuavam a estudar.
Quis o destino que ele e o irmão, filhos de funcionário público, pudessem continuar a estudar. Ela com o pai ligado às lides do mar por lá ficou, fazendo o percurso normal dos jovens de então, trabalhar, casar para constituir nova família.
Ele continuou os estudos, mas por força das condições económicas de seus pais voltaram para a cidade grande, de onde tinha saído aos oito anos. Para trás ficaram alguns amigos, amigas e amores de juventude. Novos amigos, novos amores com namoro, outros horizontes, novos mundos, com a vida a ficar suspensa com a mobilização para a guerra em África. Sobrevivente dessa guerra inglória, logo no regresso casou constituindo nova família. Os anos passaram, apenas nas férias a sua família fazia férias na praia de juventude onde cresceu e aprendeu a conhecer o mar, a ouvir Neptuno e a respeitá-lo.
Um dia já ele estava divorciado, ao passar numa das ruas da cidade por onde tantas vezes passou em jovem viu a antiga colega de turma. Os anos passavam, há mais de cinquenta anos que não se falavam, até que um ano tomou coragem, entrou na loja, a empregada perguntou-lhe o que ele desejava, apontando ele que desejava falar com a pessoa que estava a atender outra pessoa. Esperou uns momentos olhando os artigos expostos até sentir que as pessoas já tinham saído. Olharam-se, sorriram e ela diz-lhe o nome completo dele, ao que ele retorquiu dizendo-lhe o nome completo dela de solteira. Agora, ele sempre que passa pela rua, entra na loja para a cumprimentar e desejar-lhe o melhor que a vida tem para dar à sua família.
Eram jovens e hoje são grisalhos com caminhos distintos.

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