Preparava-me
para jantar quando ouço um dirigente sindical justificar na sua
opinião a justeza da greve em curso. Queixava-se o dito sindicalista
que há colegas de profissão que há dez anos estão no mesmo
escalão.
Quer
dizer, na função pública continuam a existir vícios e pensamentos
que há muito deveriam estar enterrados. Vícios e pensamentos
corporativos que dirigentes sindicais assumem como um dos motivos
para uma greve de luta.
Lembro-me
do meu pai, que quando jovem queria ser agricultor, mas vicissitudes
da vida o trouxeram como praça para a extinta Guarda Fiscal,
sujeitando às regras para-militares da organização enquadrada no
Ministério das Finanças. Para poder evoluir, nas horas vagas do
serviço estudava para todos os anos se submeter a exame por forma a
subir na escala hierárquica. Na lista oficial final desses exames
nunca figurava em lugar de promoção. Foi sempre a exame com o saber
dos seus estudos, sem notas por debaixo da mesa. Depois do 25 de
Abril, o irmão Chico, meu tio, colocado no Comando Geral, teve
acesso às listas dos ditos concursos e na lista após-exames meu pai
nunca figurava abaixo do quinto classificado, mas oficialmente havia
outras notas bem mais interessantes. Tempo «das públicas virtudes
brancos costumes».
Outra
situação passou-se comigo. No serviço militar fui colocado em
Chaves no então BC10 para dar instrução como Aspirante. Por razões
que desconheço fui colocado como adjunto do Oficial de Operações.
Para poder cumprir os preceitos de promoção a Alferes fui um dia
fazer uns dias de campo numa das serras que circulam a cidade. O
Comandante da Base um dia chamou-me e deu-me a ordem de por alguns
soldados a ajudarem o cozinheiro a descascar as batatas. Dirigi-me
com os galões nos ombros a uns soldados que se encontravam deitados
a. apanharem
sol, que o tempo ainda era
freso. Um desses soldados olhou-me sem se levantar e perguntou-me se
eu sabia quantos meses tinham de tropa ou quantos dias lhes faltavam
para a “peluda” (termo que designava a disponibilidade, o fim do
serviço militar), apontando de seguida para um outro grupo
dizendo-me que os outros eram “maçaricos” e bons para fazerem o
trabalho, continuando todos deitados indiferentes. O capitão que
comandava a base observava a cena, chamou-me e disse-me “ O
Aspirante Andrade não sabe que no serviço militar a velhice é um
posto? Ponha os outros na cozinha a ajudar”. Isto passou-se em
1972, depois disso existiu o 25 de Abril em 1974, mas em 2018 ainda
há nas estruturas de funcionários públicos e dirigentes sindicais
que acham que “a velhice é um posto”.
Grevistas
quase todos a reclamarem por revisões de carreira, isto é, mais
dinheiro de forma automática porque a velhice continua um posto!
mas, nenhum a reivindicar melhores mais justas e difíceis avaliações
a fim de dignificar a função que desempenham. Porque?
Depois, dizem os políticos, e dizemos todos nós que merecemos e queremos
melhor e mais eficiente Estado, mas será que com pensamentos destes
vamos algum dia ter melhores serviços do Estado à comunidade?
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