A
minha preocupação és tu. Enquanto eu puder, vamos os dois passear
logo pela manhã, para tu chegares a casa como se não tivéssemos
andado o que andamos, enquanto eu chego cansado, arrastando-me ao
subir as escadas até ao terceiro andar para que possas ganhar massa
muscular, eu já sem grandes forças lá sigo umas vezes à frente,
outras atrás, porque tu me cansas e às vezes me tiras do sério,
chego quase a perder a paciência contigo, quando queres saltar para
as outras pessoas que se cruzam no nosso caminho, ou quando queres
voar atrás dos pombos, das rolas, melros e passarada, bem te digo
que tu não tens asas para poderes voar atrás deles, mas és teimosa
e pensas, já que não consegues voar talvez consigas subir às
árvores, por isso te digo coisas que não deveria dizer, grito e
ralho contigo, parecendo mais um maluco, para logo depois mesmo sabendo que eu estou zangado, vires não só pedir uma festa, saltares e tentares dar aquela
mordida suave que, com teus dentes finos de cinco meses são
terríveis.
À
noite ou ao fim da tarde lá vamos nós dois renovar o circuito que
costumamos fazer, às vezes igual ao de manhã outras por outros
caminhos, para que possas aprender a andar junto comigo. Não sou
muito da educação só por estímulos positivos, porque tu esperta
como és, pareces puxar a trela para eu te fazer parar e logo te
sentas a olhar para o bolso onde levo os biscoitos da ordem. És
esperta e sabes muito. Os nossos passeios nocturnos são sempre mais
calmos, menos pessoas a cruzarem-se connosco e a passarada nos seus
recantos a descansar. No final chegamos cansados de tal modo que, não
sei quem se deixa dormir primeiro, se sou eu ou se és tu.
Quando
fixas o teu olhar no meu e pões a cabeça de lado e depois do outro
estabelecemos a nossa comunicação, ainda com alguns cortes ou
interferências, mas já é pelos olhos que mais nos entendemos.
Quando
ficamos em paz, dou comigo a pensar, como será, se ou quando, eu não
puder andar contigo os nossos quilómetros diários? Fui eu que te
escolhi, que culpa tens tu de seres como és? Que culpa terei eu em
te ter escolhido? Porque me preocupo eu contigo?
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