Entramos
no segundo dia do agora designado tempo de calamidade. Tirando o
aumento do transito automóvel na Estrada Nacional 10, notei e tomei
nota que já não posso atravessar as passadeiras para os
peões sem voltar ao momento
anterior ao estado de emergência. Contei-os e só o condutor da
quarta viatura ao ver-me já com o pé quase dentro da estrada parou
olhando com cara de poucos amigos para mim. Deve ser do clube dos que
pensa que ando o dia todo a passear a minha amiga, ou então como
alguns outros que passavam por mim quando se dirigiam para a estação
do comboio e se cruzavam comigo olhando-me com aquela cara de virgens
ofendidas talvez porque a minha amiga não anda com açaime. Tristes
coitados.
Olho
a primeira página dos jornais. Nada de novo, tudo como dantes, cada
um cumprindo a sua missão ao
serviço dos interesses sem rosto. Nos ditos desportivos então a
coisa ainda piora em
notícias falsas e alarmistas dos interesseiros que dominam o
sistema. Abro a televisão
ao tomar o pequeno almoço. Felizmente não sou de vomitar
facilmente, tenho bons ácidos no estômago e quando atinjo o ponto
de fervura falo e grito-lhes as minhas verdades com todo o chorrilho
de palavras bonitas que a nossa língua encerra. Eu sei que eles não
me ouvem mas deixar a revolta ficar presa no peito não consigo.
Caminho para um estado
lúcido de loucura mas prefiro assim do que ir no rebanho, na manada
ou na vara só porque os outros vão e pensam ser esse o melhor
caminho.
Às
vezes fico a pensar entrando em rotundas onde dou voltas e voltas à
procura de uma saída e não a encontro. Viver neste tempo de tanta
falta de respeito pelo outros não está fácil. Já nem falo da
solidariedade que deveríamos ter todos uns com os outros, quanto
mais da fraternidade e igualdade. Dizem-nos os arautos do sistema que
o malfadado vírus é democrático que
não olha a classes sociais. Deixo-me rir quando os ouço. Sim, somos
todos humanos iguais face ao vírus como com qualquer outra doença,
por exemplo o cancro. Só que há humanos que viajam em primeira
classe, outros em segunda e uma multidão ainda em terceira classe ou
uns navegam em camarotes e outros no porão. Somos
todos iguais uma porra. Que as leis de um estado se apliquem a todos
por igual é uma coisa boa felizmente, mas o todo é a cada dia mais
heterogéneo,
diferenciado, diverso,
pelo que, a aplicação
desse princípio igualitário não tem as mesmas condições de
cumprimento para todos.
Neste
tempo de pandemia, de medos irracionais, de ansiedades muito
diversas, não vejo ideias que não gravitem à volta dos eternos
interesses monetários.
Dizer
que vamos produzir o que nos habituamos a importar da China é musica
em violino sem cordas.
Onde,
quando e como vão dar ou doar os tais quinze milhões a comprar
publicidade aos órgãos de comunicação social que comunicam muito
mas pouco informam?
Gosto
da telescola agora com outro nome mais moderno. Todos os alunos a
ouvirem o mesmo ensinar. Nasci e estudei no tempo do livro único. Todos aprendíamos as mesmas verdades e as mesmas mentiras. Não foi
o livro único que me inibiu a mim e a muitos como eu de pensarmos de
forma diferente, de duvidarmos que a coisa poderia ser assim ou não.
Lá vou eu entrar num outra rotundo com tantas saídas que não sei
qual a melhor para o futuro das minhas netas e neto.
Vou
pedalar para outra freguesia.
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