terça-feira, 14 de setembro de 2021

21.07.29 Ando cansado



Estou cansado. Sinto-me cansado. Estou na praia e não vou à praia. Leio e quanto mais livros leio mais distante me sinto desta vida. Raramente leio jornais. Lia o Público mas até esse deixei de ler nestas últimas semanas. Há muito hipócrita a escrever coisas que não me agradam. Muitos a tentarem malhar no Governo com o objectivo de desgastarem a Democracia e a Constituição que a garante. As redes sociais são campos minados de notícias falsas onde é cada dia mais difícil distinguir o falso do verdadeiro, a humildade da vaidade.

Na altura tive conhecimento do que se passou em Angola entre as forças do MPLA fiéis ao senhor Agostinho Neto e as forças do MPLA fiéis ao senhor Nito Alves. Nunca imaginei que a luta entre duas facções levasse a uma purga tão grande de tantos assassinados sem julgamento. Tinha conhecimento das divergências que ocorreram entre os guerrilheiros na Zâmbia comandados por Chipenda, a chamada "Revolta Activa" em oposição à nomenclatura central do MPLA no Congo Brazzaville. Dessas divergências resultou o enfraquecimento das acções guerrilheira no Leste de Angola. Conhecimento, porque aos domingos quando estava no arame farpado o cabo cripto me cedia as chaves do seu gabinete e sorrateiramente entrava para ler todas as mensagens e relatórios considerados "confidenciais". Aquando do 25 de Abril de 1974 a acção do MPLA no Leste de Angola era quase nula, pelas divergências internas e pela acção das "Nossas Tropas".

O livro "Em Nome do Povo, O Massacre Que Angola Silenciou" de Lara Pawson, da editora Tinta da China, fez-me pensar em tantas coisas.

A guerra entre as Forças Armadas Portuguesas com os movimentos guerrilheiros MPLA, UNITA E FNLA, terminou sem vencedores, de todos os lados só existiram perdas. O cessar-fogo é consequência directa da acção gloriosa ocorrida em Portugal no dia 25 de Abril de 1974 com a mudança de regime político e não de qualquer facto ocorrido naquela colónia. Qualquer dos três movimentos estava enfraquecido nas suas acções de guerrilha quando se dá a mudança de rumo na política em Portugal.

Em finais de 1974 estava em Luanda aguardando o regresso a Portugal. Os sinais do que se iria passar no decorrer de 1975 eram já evidentes. Cada um dos três movimentos julgavam-se donos e senhores de Angola sendo incapazes de se entenderam tal o ódio que nutriam entre si. Todos queriam o poder.

Depois de ler "Em Nome do Povo" vem-me à memória a minha visita a uma loja do MPLA em plena cidade de Luanda. Chegamos a Luanda vindos da fronteira Norte no início de Novembro. Os soldados ficaram aquartelados no Grafanil. Os graduados, furriéis e alferes, espalharam-se em pensões e hotéis pela cidade. Com o amigo Mário arranjamos um quarto para os dois numa pensão. Todos os dias pela manhã ou ao início da tarde apanhávamos um táxi para irmos ao Grafanil inteirarmos-nos da situação da Companhia. Numa dessas tardes quando regressamos a Luanda seguindo a pé passamos por uma loja do MPLA dizendo ao meu amigo para esperar por mim que ia procurar pelo livro de poesia do senhor Agostinho Neto. Ao entrar fardado como alferes do exército português o ar gelou, todos os jovens que estavam nos dois pisos pararam olhando-me com olhos ameaçadores de animais felinos. Com calma cortando o ar gelado cheguei junto da menina do balcão em frente e perguntei pelo livro de poesia, informando-me a menina que estava esgotado, virei-me para o balcão dos discos de vinil na altura a música que saia das colunas também já tinha gelado. Escolhi um LP que ainda hoje guardo, paguei e virando costas, saí sem olhar para trás com a sensação que se olhasse para trás algum deles me iria espetar uma navalha. O meu amigo esperava-me e chamou-me de louco. Passamos pela pensão, mudamos de roupa e lá fomos para a Restinga no início da Ilha de Luanda beber imperiais com camarões e caranguejo de Moçâmedes. Hoje ao ler a matança que ocorreu nos dias que se seguiram ao 27 de Maio de 1977, pergunto-me se todos aqueles jovens seriam "netistas" ou "nitistas" e se "nitistas" será que sobreviveram à matança desencadeada por Agostinho Neto e cubanos?

É muito triste como um país com tantas possibilidades de ser um país rico economicamente viva subjugado por uma elite que do propagado marxismo passou ao capitalismo puro e duro usurpador das riquezas em proveito próprio deixando milhões de angolanos viver na miséria. 



 




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