Estamos
a chegar ao fim deste tempo de emergência. Quarenta e dois dias
depois de o mesmo ser inicialmente decretado pelos que têm e usam o
poder de decretar estas coisas. Saímos da emergência, iremos entrar
noutro estado com outro nome pomposo de meter medo, "calamidade"
assim dizem os que parecem saber destas coisas de estados para nos
meterem medo e fecharem-nos em casa a papar continuamente doses de
drogas televisivas sem qualquer valor educativo de como nos devemos
comportar socialmente em colectivo de liberdade. Só drogas
noticiosas de meter medo esses papagaios de mau gosto nos dão. Eles
sabem como eu como muitos de nós que o medo é irracional,
aguardando ansiosos que a terrível ansiedade promovida pelo medo
lhes permita noticiar esses tristes acontecimentos em exclusivo,
publicando ou mandando publicar posteriormente que a divulgação de
tal reportagem bateu todos os outros papagaios maldizentes
concorrentes.
As
minhas dúvidas desfazem-se são quase certezas mas guardo-as no meu
arrumario para mais tarde.
Levantei-me
mais ou menos à minha hora. Com os olhos meio abertos procurei ver
as primeiras páginas dos jornais. O que me pareceu ver na noite de
ontem quando saltava de canal em canal parecia confirmar-se. Saí
para a minha habitual caminhada com a minha amiga. Mais carros a
circularem na E. N. 10 em direcção à cidade grande. Bom sinal.
Pensei mas logo me assaltou a dúvida. Que embora viva sem medo do
vírus as dúvidas não me deixam em paz e por tudo e por nada me
assaltam. De tão duvidoso que ando, fico por vezes a olhar o espelho
para confirmar se ainda sou eu mesmo. Os trabalhadores do costume
cruzaram-se comigo. A maioria usando mascaras diversas. Camiões que
entram e saem dos centros logísticos enquanto outros aguardam a sua
vez.
Ao
tomar o pequeno almoço vi com mais atenção as imagens da tal
reunião que ontem o PM teve com dirigentes do pontapé na bola e de
três clubes chamados de grandes. Junto com o PM havia pelo menos
dois Ministros, o da Economia e o da Educação que tutela o
desporto.
Todos
numa sala. Todos sem máscaras antes, durante e depois. Sobre o
péssimo exemplo dado por aqueles responsáveis nem uma palavra ouvi,
nem li nos jornais. Naquela sala a concentração das tais gotículas
que produzimos ao falar e ficam a planar no ar foi muito superior às
tais gotículas que se poderiam produzir nas comemorações do 25 de
Abril na Assembleia da Republica com o dobro dos que nela
participaram.
Contra
as comemorações do 25 de Abril muitos falaram. Alguns pelo ódio
que nutrem ao espírito do dia, outros pela santa ignorância de quem
vai na
manada
sem se aperceber da qualidade da comida que lhe oferecem.
Por
estas e por outras é
que
as minhas dúvidas me assaltam e me inquietam. Algo não bate certo
mas ainda não descobri. Há muito ruído no ar. Agora que a poluição
ambiental diminuiu sobe a poluição sonora a níveis de decibéis
que não me deixam ver o que está nas
entrelinhas. Uma coisa é certa, a quarentena seja em emergência ou
calamidade só interessa a quem esta infectado.
Não
são todos os lares de idosos obrigados por lei a terem contratos com
médicos e enfermeiras? Algo vai mal, muito mal… há muito que
também neste sector da actividade económica lucrativa o rei vai nu
mas gostam de nos venderem gato por lebre… atirando
depois areia para os olhos quando o telhado começa a ruir
Quantos
pescadores que todos os dias saem para o mar em busca do seu sustento
se infectaram no mar?
“Quem
é cego para o futuro vive sem sonhos” (Mia Couto, O Universo Num
Grão de Areia)
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