sábado, 11 de março de 2023

22.12.15

 

Vive-se ou resiste-se na incerteza dos tempos que correm. Quase tudo o que nos vendem não passam de ilusões laboriosamente trabalhadas por agências especializadas em tais serviços altamente remunerados para que outros vivam e consumam tudo o que eles nos impingem sem que tenhamos tempo para parar um pouco e poder pensar nos porquês da sua própria vida. Dominam assim a multidão que os segue sem reservas, cantando, rindo e aplaudindo, pela informação alienante do pensamento único como verdade absoluta do caminho para a felicidade, para o paraíso celeste. 

A história ciclicamente repete-se. Ciclicamente se criam novas versões dos bons contra os maus e vice-versa. Os factos passados não se alteram mas podem-se reescrever consoante o objetivo da classe dominante.

Recusa-se, tenta resistir sentindo-se dia a dia impotente perante a avalanche que corre pelos ares, por ruas e avenidas e lhe entra em casa mesmo tendo portas e janelas fechadas e trancadas, não as tendo seladas porque ainda é um ser humano como tal um ser sociável.

Os ombros pesam-lhe. Os rins queixam-se. Tem dores nos braços, nas virilhas, as artroses nos dedos das mãos atacam de novo; diz-lhe a jovem médica que tem um pequeno problema no coração sem gravidade mas que pediu aos colegas hospitalares para o analisarem e ele aguarda sem ansiedade a carta do hospital do SNS sem se queixar; sabe que sucessivos governos de práticas liberais e neoliberais que se auto designam da social-democracia-pragmática, têm paulatinamente desinvestido técnica e humanamente da maior riqueza que o pós 25 de Abril deu aos cidadãos deste país (os governantes estão mais preocupados em investir milhões a salvar bancos privados das práticas dolosa dos seus banqueiros e capatazes, do que investir esses milhões no SNS público, com novas tecnologias, pagando de forma mais decente aos pessoal técnico especializado da saúde que nele trabalha). 

O pior é que a sua cabeça resiste, guardando nela em estado aceitável a sua unidade de processamento de dados, a sua memória viva consciente até ao inconsciente. É a sua maior riqueza. Os poucos bens que possui chegam-lhe. Tem onde dormir, tem o seu cantinho de setenta metros quadrados ou nem tanto. O dinheiro da reforma que por vezes consegue poupar alimentam o vício salutar da compra de mais livros. Até na compra dos livros rema contra a maré de autores que lhes impingem os poderosos da distribuição. Quando passa por montras e bancas de livros em centros comerciais ou grandes supermercados, que ele não é bicho do mato, ouve o riso da sua sombra com as leituras fúteis que impingem ao rebanho da multidão.

Não sendo bicho do mato, no seu Natal oferece livros, vinhos, produtos do seu interior raiano e também tecnológicos. Às netas e neto dá dinheiro para que elas e ele com os pais possam fazer o que mais gostam. Gosta de oferecer aquilo que possui não embarcando nas modas vigentes. Não tem sido fácil mas vai resistindo.

Escreveu nos seus apontamentos que na sua janela não há bonecos de pai natal pendurados, na sua janela assim como na sua chaminé também não há pai natal nem luzinhas a piscar produzidas por crianças orientais em trabalho semiescravo, na velha chaminé há um sapatinho de tão velho que se encheu de pó tão branco como as suas barbas, ambos, ele e o sapatinho, na velha chaminé, procuram resistir ao consumismo desta sociedade, tendo nela o seu presépio todo o ano simbolizando a imagem do nascimento de Jesus que naquele tempo em que viveu foi Esperança dos pobres e oprimidos.

Pensando assim, vive um Natal utópico em comunhão com as imagens que guarda na sua memória, de seus pais, dos seus Natais simples só os quatro em perfeita comunhão, que nunca foram de ceias faustosas de iguarias várias. Na noite da consoada, assim chamavam à noite de 24, comiam bacalhau com couves e batatas, por vezes acabavam de fritar as filhoses que a mãe tinha amassado durante a tarde, tudo dependia se o pai estava de folga, plantão ou de serviço. Enquanto se fritavam as filhoses cantavam canções ao nascimento do Menino Jesus, canções da Beira Baixa raiana. Deitavam-se os irmãos na expetativa do que estaria na manhã seguinte no sapato que tinham deixado na chaminé. Na manhã de Natal a mãe não precisava de os mandar levantar. No sapatinho lá estavam um pulôver, um par de meias ou umas cuecas novas e pouco mais. Coisas úteis que se vestiam para depois irem à missa e poderem depois levar para a escola. Não havia naquela aldeia do litoral missa do galo ou outras festividades natalícias. A vida era difícil mas simples. A arma mais poderosa da alienação das mentes ainda não era eletrodoméstico popular, eram raros os que possuíam televisão em casa. Havia televisão no café da aldeia, mas a noite da véspera, a consoada, era nas casas de cada um. A televisão chegou à casa deles muito mais tarde, quando o irmão mais velho começou a trabalhar e foram os dois irmãos à Avenida Almirante Reis comprar uma lá para casa.

Hoje, tudo é diferente, tudo parece mais simples numa ilusão que apenas serve a alienação das massas num consumo excessivo de tudo, numa concorrência inconsciente pelo ter, esquecendo-se a solidariedade e a fraternidade entre os povos que o nascimento de Jesus representou.

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