quinta-feira, 16 de março de 2023

25.01.23

 

Acorda nostálgico de um tempo que não viveu. A nostalgia tem sido sua companhia nos últimos dias. Às vezes a nostalgia convida a tristeza para lhe fazer companhia. Sabe a origem do seu estado, do seu viver solitário no mundo dos outros, dia a dia mais desenquadrado, tresmalhado até, vivendo numa concha que se vai fechando, guardando nela a esperança que ainda o acompanha, mas até esta vai perdendo brilho, ficando pouco a pouco mais baça.

Os ombros sentem o peso da silenciosa loucura que indiferente ao seu desejo se instala e o castiga. Não lhe chegava o silêncio das filhas para carregar aos ombros, que agora tem de carregar também o peso da silenciosa loucura.

Indiferente ao frio ou ao calor o seu organismo vai funcionando mesmo que por vezes sinta medo de dores novas não conhecidas. Quando o medo das dores o invade a sua preocupação é a Sacha, quem irá tomar conta dela, quem irá andar com ela?

Os olhos ainda sorriem quando se olha ao espelho, ainda se humedecem quando se recorda dos mimos da mãe, dos olhinhos de seu pai sorrindo quando iam os dois comer o bacalhau à brás nas Termas de Monfortinho, pais especiais os seus. Sabe que não pode viver do passado, pois este foi uma lição de um livro sem folhas, só tem o presente já que o futuro não existe, sendo apenas formado por sonhos e desejos não se sabendo nunca como é o vazio a que se chama futuro.

Em Alverca, na Consolação ou na Zebreira o seu organismo desperta depois das cinco ou seis horas de sono. Por vezes fica acordado até sentir que já chegou às seis. Sente sempre saudades do seu quarto na Zebreira onde acordado na sua cama de ferro dos seus antepassados, pode olhar os ramos da velha oliveira que lhe indicam como vai o vento, se a chuva caiu durante a noite, como está o céu. Na cidade dormitório ou na praia não conhece essa felicidade de poder dormir olhando o céu por entre os ramos da velha oliveira.

Hoje antes de sair voltou a olhar as previsões da temperatura no seu aparelho de comunicação. 4 graus em Alverca. Saiu com a sua roupa normal, apenas trocou a boina por um gorro que a companheira lhe fez. Na rua viu gente enroscada em roupa e muitos outros como normalmente os vê nas suas deambulações pelas ruas da urbe com a Sacha. O frio é o normal deste tempo de inverno, e, o mesmo tem sido ameno não se podendo queixar do frio segundo o seu entender de tresmalhado, só agora nos últimos dias foram visitados por esta frente fria polar. Frio, frio conheceu ele em Angola no interior a 1500 metros de altitude na época seca a que chamam cacimbo, aí sim conheceu o frio. Nos últimos anos com as suas estadias na Zebreira onde o frio também aperta, foi-se acostumando e é assim que estranha ver tanta gente enroscada em roupa. Na cidade em casa não usa aquecedor elétrico na divisão onde passa a maior parte do tempo, veste um casaco polar e coloca sobre as pernas uma manta passando assim os invernos. Voltou a não apanhar a vacina contra a gripe, nem mesmo a vacina que dizem ser reforço para a nova variante do virús “sars-cov-2” foi apanhar.

Passa os olhos pelas notícias da guerra. Notícias não televisivas, pois não acredita no que falam as televisões. Aliás, de verdade não acredita em nenhum dos vários lados da guerra. Não acredita porque não gosta dos políticos que promovem a presente guerra, nem dos outros sonsos que a apoiam. Como na maioria das guerras quem se lixa é o mexilhão, ou seja, os soldados que combatem na frente das batalhas. Horrorosa é a guerra porque numa guerra sempre se cometem horrores. O ser humano transformado em máquina de guerra é capaz de fazer o que nunca pensou, ou seja, o impossível sem olhar aos meios, nem se importar se é ou não justo porque as máquinas não pensam, sabendo ele que só matando o outro poderá sobreviver à própria guerra. É fervoroso defensor da paz entre todos os povos do Planeta. Nenhum povo tem direito de impor ao outro, vizinho ou não, o seu pensar, o seu modo até de controlar a vida dos seus cidadãos.

Só hoje a oficina lhe entrega o carro. Pensou ainda que poderia ir amanhã para o seu canto. Ao longo da manhã começou a sentir que o melhor seria ir só na sexta-feira. O senhor limpa-chaminés irá lá no sábado, a casa vazia há dois meses estará muito fria, assim só terá parte de sexta para sentir o frio da mesma, já que se tudo correr bem no sábado poderá por a funcionar a salamandra, tornando a casinha mais aconchegante. Na dúvida, consultou o pêndulo confirmando que será melhor ir na sexta-feira.



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