segunda-feira, 15 de janeiro de 2024

04.12.23

 

A vida deste pequeno burguês na apanha da azeitona não é fácil. Vivo uma nova lição que mais acentua o meu ser tresmalhado do rebanho; já não é um sentir de revolta, antes e apenas mais uma lição, um aprender de como tudo nesta vida poderia ser diferente do modo como os mandantes sem rosto nos seus palácios forrados a ouro nauseabundo, decidem e nos parametrizam a forma de vivermos em desrespeito às regras da Natureza que nos deu origem e nos vai sustentando a vida como a conhecemos.

Levanto-me o mais tardar pelas 05H30, poucos são os dias que quando o despertador toca ainda estou na horizontal; na casa de banho olho as primeiras páginas dos jornais e dou uma vista de olhos pela rede social, despacho-me pelas seis horas, meço a pressão arterial e registo os valores na folha de cálculo do aparelho de comunicação, visto-me, faço a cama, abro as portadas das janelas, saindo pelas seis e meia para a volta matinal com a Sacha, regressando a casa pelas sete da manhã dando-lhe de comer; tomado o meu pequeno almoço, preparo a bucha do almoço no campo, não me esquecendo da imprescindível garrafa de água, caso contrário os meus rins apresentam queixa ao sistema urinário.

Há hora certa no mesmo local o meu amigo chega no seu carro, seguimos pelo caminho da Fonte Nova até ao caminho para o Calacu para ficarmos no Valongo onde tem as oliveiras.

Ontem, domingo, a temperatura anunciada no telemóvel dizia três graus com a sensação de dois graus. Quando chegámos vimos de imediato que a geada foi forte, ao colocarmos os panais junto da primeira oliveira da manhã os mesmos estavam gelados, assim como a oliveira e os seus frutos; aquela oliveira segundo o meu amigo, foi o “tio Charneco velho”, homem lá de cima, do norte?, que a trouxe desconhecendo-se a característica, foi batizada como “azeiteira”; ramos e azeitonas cobertas com a fina camada da geada que deixava as mãos geladas ao retirá-las dos ramos, com os pequenos pedaços de gelo a ficarem quer nas mãos e luvas quer nos panais. As mãos geladas trabalhavam, já os pés parados em cima do panal doíam de gelados, do meu nariz caiam de vez em quando pingos sem que sentisse qualquer necessidade de espirrar ou mesmo de me assoar. Quando esperava que o Sol pudesse aquecer aquele ambiente gelado, eis que chegou em vez do Sol o não desejado nevoeiro que arrefece e gela o corpo com a sua humidade fria. Dia duro e difícil para esta atividade da apanha de azeitona, mas lá fomos fazendo a apanha das azeitonas com o meu amigo sempre a fazer dois em um, isto é, trabalhando com a máquina, cortando e limpando as oliveiras de modo a puxá-las para baixo para que no próximo ano o trabalho se inverta, ou seja, muito mais máquina de varejar e muito menos trabalho manual, isto se a Natureza for amiga na época da floração e depois em Setembro por altura da festa em honra da Nossa Senhora da Piedade caírem umas águas dos céus para que as oliveiras que se alimentam mais pelas folhas do que pelas raízes superficiais possam dar corpo às azeitonas. Acabamos o domingo procedendo à limpeza da azeitona apanhada no dia e no anterior.

Cheguei a casa ao final da tarde com os pés e mãos geladas num corpo frio a pensar na política de preço do azeite.

Há muitos anos que não me lembro de sentir o corpo tão frio e gelado. Vida dura esta da apanha da azeitona em oliveiras de exploração extensiva todas elas com idades centenárias.

Tem sido assim a apanha da azeitona, desde que a chuva ou o nevoeiro denso o permitam e já vamos em Dezembro quase a acabarmos a nossa tarefa de entreajuda.

Ontem, segunda-feira, tivemos nos céus a visita dos grifos, algum animal morto os chamou pois voavam em círculo sobre um determinado local, grifos das encostas escarpadas do rio Erges ou mesmo do rio Tejo vieram em busca de alimento. Depois foram embora e nós voltamos a estar sós com o silêncio do campo aqui e ali interrompido pelo canto das aves.

Este ano o preço do azeite subiu dos 25€ em anos anteriores para os 40€ o garrafão de 5 lt, quer nos lagares quer em produtores que pela quantidade de oliveiras que possuem vendem depois o azeite obtido a particulares. Os nossos vizinhos espanhóis grandes produtores e consumidores de azeite já o compram a 60€ o garrafão de 5 lt. Não sei se a subida de preço é apenas especulação, mas quem vota em políticos que defendem ou aplicam medidas económicas liberais para a economia não se pode nem se deve queixar já que o custo do azeite este ano é o célebre deus do mercado a funcionar face à fraca produção do olival espanhol, pois são eles que determinam o preço do azeite no mercado internacional.

O azeite que obtive das minhas oliveiras não é para vender, mas sei que pela qualidade que obtive em dois lotes de azeitonas diferentes, nunca o iria vender por menos dos 50 ou mesmo 60€ que os espanhóis já pagam, é que o azeite produto natural que nestas terras de Zebreira em especial e na zona raiana em geral, não é o mesmo azeite que se vê nas prateleiras dos supermercados.

Há azeites e azeites e quem quer bom, barato e natural já não encontra.

O azeite do olival extensivo das diferentes qualidades de azeitona tradicionais, produzido a frio de acordo com as normas estabelecidas pelas autoridades, não está caro. 

O português trabalhador, reformado ou pensionista é que ganha e recebe pouco, com os governos da Nova Ordem Democrática a optarem pela manutenção da baixa remuneração do fator trabalho como forma de progresso económico e social que só alguns extratos da média e alta burguesia conseguem alcançar, mas a malta, o rebanho, segue cantando e rindo, «tudo a bem da nação» que agora são todos classe média, exceto alguns poucos tresmalhados que teimam em andar pela outra margem da vida, pensando nas coisas pela sua própria cabeça, como ginástica para fugir da velhice que lentamente se vai instalando neste pedaço de Natureza que já foi um jardim à beira mar.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.