quarta-feira, 10 de janeiro de 2024

05.08.23

 


Quando ando nas voltas com a Sacha, quando no começo do dia vagueio pelas ruas desta pequena povoação ou quando olho o mar abrindo os braços à nortada dos últimos dois dias, ocupo a mente com ideias para escrever, converso com elas indiferente aos poucos seres que se cruzam comigo. Chego a casa com tantas ideias, contudo ao entrar em casa, as ideias ficam lá fora na rua ou escondem-se no fundo do cérebro deixando-me vazio. Até mesmo os livros que trouxe para ler se apresentam tristes quando os olho com este meu estado em que não escrevo, não os leio nem vejo televisão ou ouço rádio. Vejo as capas dos jornais e o que um ou outro escrevem no mundo do Facebook sobre a maldita guerra, mas até essas mensagens/notícias do outro lado escasseiam neste dias em que só se fala no evento religioso dos cristãos católicos apostólico romanos, como se o mundo e a vida girasse apenas à volta dessa organização religiosa, que promove com gastos públicos de milhões aquilo que designo pela peregrinação do egoísmo mais egoísta, com toda aquela massa de gente a pôr nas mãos de um Deus que ninguém sabe de verdade quem é ou se existe, aquilo que lhes compete a eles e todos os outros seres humanos resolverem.

Também fui religioso durante a juventude, praticante de missa e terço que cheguei a equacionar entrar no seminário para ser padre com o objetivo de poder pregar o bem; mas em 1969 ao saltar o muro para o mundo da igualdade, da fraternidade e da solidariedade, ao abrir a mente ao outro lado da vida deixei de imediato para trás a religião. Ao estudar, ao ler sobre o passado como nasceu e cresceu a religião cristã compreendemos melhor o seu papel sempre ao lado das classes abastadas opressoras e exploradoras dos desprotegidos da sorte; da Igreja católica portuguesa nunca ouvimos uma crítica ao regime da ditadura de miséria salazarista-marcelista, nunca ouvimos uma palavra de apelo à paz com os povos das antigas colónias africanas. Antes, por todo o país nas missas semanais domingueiras faziam a apologia do regime ditatorial que o velho tirano implementou glorificando-o, os povos africanos que nos combatiam eram a encarnação do mal, do diabo, pelo que ir à guerra era um desígnio de Deus para se poder alcançar a palavra da salvação. Por tudo isto caminho desligado da vida, só as conversas com amigos de infância e juventude me fazem lembrar que ainda resisto, ainda vou andando consciente da minha insignificância incomodativa para o rebanho que segue acéfalo o que lhes contam horas a fio os servos papagaios e pegas sem penas televisivos. 


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